terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Auxilio classe adulto - Uma Salvação Grandiosa

 RETIRADO DO LIVRO:  A supremacia de Cristo.

No capítulo 1, o autor mostrou a superioridade de Jesus em relação aos anjos. Neste capítulo, o autor demonstrará as implicações práticas daquilo que ele afirmara. Os intérpretes destacam que a superioridade de Jesus em relação aos anjos acontece em três aspectos:
1. Nenhum dos anjos podia trazer a nova relação entre irmãos,
2. Nenhum dos anjos podia livrar os homens do temor da morte (Hb 2.14-16);
3. Nenhum dos anjos podia realizar a obra da expiação pelos pecados (Hb 2.17-18).

"Portanto, convém-nos atentar, com mais diligência, para as coisas que já temos ouvido, para que, em tempo algum, nos desviemos delas" (v. 1). Aqui, o "portanto" (gr. dia touto) tem o sentido de "acordo com o que acabei de mostrar". Nesse contexto, "portanto" é usado em referência à superioridade de Jesus sobre os anjos. Uma verdade de tão grande magnitude deveria ter recebido uma maior atenção por parte dos leitores. Eles deveriam ter atendido as verdades ensinadas com maior diligência. O termo grego prosechein, traduzido aqui como "atentar", tem o sentido de "prestar atenção a, atender, dar ouvidos" .1 O termo é usado no sentido de dar uma resposta positiva ou negativa a uma mensagem recebida. É usado em Atos 8.6 para afirmar que as pessoas "atendiam" unânimes as palavras pregadas por Filipe. Por outro lado, em Tito 1.13,14, é usado para exortar os crentes a "não dar ouvidos" às fábulas judaicas. Em ambos os casos, a participação do ouvinte é requerida. Pedro afirma que seus leitores faziam bem em "atenderem" a palavra profética (2 Pe 1.19). Esse mesmo termo é usado por Lucas para narrar a conversão de Lídia (At 16.14). "Certa mulher, chamada Lídia, da cidade de Tiatira, vendedora de púrpura, temente a Deus, nos escutava; o Senhor lhe abriu o coração para atender às coisas que Paulo dizia" (At 16.14 - ARA). Enquanto Paulo falava acerca do Reino de Deus, Lídia escutava a Palavra de Deus, e o Senhor abriu-lhe o co¬ ração para atentar (prosechein) àquilo que o apóstolo dizia.
As Escrituras exortam o cristão a ser vigilante e batalhar pela fé que uma vez lhe foi dada (Jd 3). O autor não queria que os crentes aos quais ele escrevia ficassem desviados da fé. A palavra "desviar" (gr. pararreô) era usada em referência a um rio que corria fora do seu leito. Podia ser usada também em referência a uma pessoa que perdia a memória ou, então, a um navio que estava à deriva.3 Franz Delitzsch (1813-1890) destaca que está presente o sentido de obter ou encontrar a si mesmo em um estado de fluxo ou de passagem, isto é, em referência a um objeto que requer muita atenção; perder a posse de qualquer coisa por não conseguir segurar.4 Essas observações fazem-nos ver que a apostasia - um ensino que o autor de Hebreus voltará a falar mais adiante - é uma realidade possível e real. Se decair da fé ou se desviar não fosse uma possibilidade, essas exortações perderiam o sentido.
"Porque, se a palavra falada pelos anjos permaneceu firme, e toda transgressão e desobediência recebeu a justa retribuição" (v. 2). Como já havia assinalado no versículo anterior, o autor refere-se, aqui, à Lei mosaica entregue no Sinai. George Wesley Buchanan destaca que havia uma tradição judaica antiga na qual se afirmava que a Lei fora entregue pelos anjos (Ant. XV. 136; Gl 3.19; Atos 7.53; Targ. Dt 33.2 ).5 Por haver sido mediada por anjos, a Lei era vista e observada meticulosamente pelos judeus. A conclusão a que o autor quer chegar é simples: ora, se a Lei, que fora entregue por anjos, merecia tanta atenção, então não merecia atenção maior ainda a palavra de Deus, que fora entregue por seu próprio Filho, o qual é infinitamente superior aos anjos? Se a palavra entregue por anjos provocou punição para quem a transgrediu, o que poderá acontecer com quem quebra a palavra falada pelo Filho? "Como escaparemos nós, se não atentarmos para uma tão grande salvação, a qual, começando a ser anunciada pelo Senhor, foi-nos, depois, confirmada pelos que a ouviram" (v. 3). Valendo-se de uma pergunta retórica, o autor indaga a seus leitores se haveria alguma chance de escape para quem fosse negligente e não atentasse para essa tão grande salvação. A resposta, evidentemente, é que não haveria chance nenhuma. A palavra grega amelesantes, traduzida como "atentar", "negligenciar", é um particípio que ocorre quatro vezes no Novo Testamento grego (Mt 22.5; 1 Tm 4.14; Hb 2.3; 8.9). Em Mateus, é usado no sentido de "não dar atenção"; em 1 Tm 4.14, é usado para exortar Timóteo a não "negligenciar" o dom de Deus; em Hebreus 8.9, é usado para dizer que Deus não "atentou" para os desobedientes.6 A salvação do cristão está condicionada à sua permanência em Cristo. Alguns creem que a salvação é dada por decreto. Nesse sentido, as pessoas eleitas serão salvas sem importar muito o que fazem ou deixam de fazer. No entanto, Richard Taylor destaca:

"A Bíblia mostra que a prática do pecado e o Filho de Deus são totalmente incompatíveis; e que a apostasia é uma possibilidade, ainda que não seja normal nem o que se espera na experiência cristã. O Novo Testamento sublinha que a fé evangélica é como um tempo presente, uma atitude contínua de confiança e obediência, 'aquele que crê no Filho tem a vida eterna, mas aquele que não crê no Filho não verá a vida' (Jo 3.36; Tg 2.14-26)".

"Testificando também Deus com eles, por sinais, e milagres, e várias maravilhas, e dons do Espírito Santo, distribuídos por sua vontade?" (v. 4). O escritor F. Dattler destaca:

"A insistência sobre os prodígios, Hb possui em comum com o 4º Evangelho onde tais fatos formam argumentos essenciais em abono da legitimidade de Jesus de Nazaré: Jo 1.14,51; 2.11,23; 3.2; 5.17-20,36; 6.14,26; 7.21,31; 9.3,16; 10.32,37,41; 11.47; 12.18,37; 14.10; 15.24. Com a morte de Jesus, os milagres não desapareceram; os discípulos fariam maiores ainda (Jo 14.12); maiores se não em qualidade, pelo menos em quantidade, como se vê nos Atos dos Apóstolos e na variedade imensa de carismas descritos em Rm 12 e 1 Cor 12."

A Igreja Primitiva, formada por crentes tanto da primeira como da segunda geração, estavam familiarizados com os carismas do Espírito. Para o autor, a Salvação não ocorreu apenas no plano subjetivo e teórico, mas também no objetivo e prático. O Espírito Santo, através dos discípulos, deu testemunho dessa salvação. Os termos gregos: semeiois (sinais), terasin (maravilhas) e dynamesin (poder, prodígios, milagres) são frequentemente usados nos Atos dos apóstolos (At 4.30,33; 5.12; 14.3,8-10). No Velho Testamento, o Espírito vinha sobre algumas pessoas especiais: o rei, o legislador, o profeta e o sacerdote. Todavia, na Nova Aliança, Ele foi derramado sobre toda a carne (At 2.17). Os crentes Hebreus possuíam consciência desses fatos, mas, mesmo assim, davam sinais de esquecimento.
Como de costume, o autor mais uma vez recorre a uma citação de um salmo (8.4-6) de natureza messiânica para validar sua argumentação. No judaísmo, esse salmo era um cântico que celebrava a criação, a tradição cristã; no entanto, devido à sua citação na carta aos Hebreus, associou-o à redenção. "Em vários períodos, o salmo foi usado para expressar o tema da imago dei no sentido de que a dignidade da humanidade é concedida e, em seguida, restaurada pela salvação/redenção".
C. S. Keener destaca que era uma crença do judaísmo antigo a de que Deus sujeitaria a seu povo o governo do mundo vindouro.10 O judaísmo dos dias neotestamentários alimentava essa esperança.
"Porque não foi aos anjos que sujeitou o mundo futuro, de que falamos" (v. 5). O fato em destaque pelo autor é que o mundo será, com efeito, submetido ao governo não angélico, mas humano. O autor afirma essa crença, porém destacando que essa promessa teve seu fiel cumprimento no Messias, que era divino e humano. O autor passa a citar o Salmo 8.
"Mas, em certo lugar, testificou alguém, dizendo: Que é o homem, para que dele te lembres? Ou o filho do homem, para que o visites?" (v. 6). Valendo-se da expressão "em certo lugar", o autor não demonstra imprecisão na sua citação, mas, sim, o uso do método hebraico de interpretação conhecido como gezerah shavar, muito usado pelos escribas para unir duas porções das Escrituras.
"Tu o fizeste um pouco menor do que os anjos, de glória e de honra o coroaste e o constituíste sobre as obras de tuas mãos" (v. 7). Essa citação não é feita para depreciar o homem; pelo contrário, é usada para mostrar sua grandeza. 11 O autor avança para o desfecho do seu comentário.
"Todas as coisas lhe sujeitaste debaixo dos pés" (v. 8). F. F. Bruce observa que:

"Quando o homem falha no cumprimento de seu propósito divino (como em alguma medida, todos o fizeram na época do Antigo Testamento), Deus levanta outro para que tome o seu lugar. Mas quem poderia tomar o lugar de Adão? Somente um que foi capaz de desfazer os efeitos da queda de Adão e, portanto, iniciar uma nova ordem do mundo".

"Vemos, porém, coroado de glória e de honra aquele Jesus que fora feito um pouco menor do que os anjos, por causa da paixão da morte, para que, pela graça de Deus, provasse a morte por todos" (v. 9). A palavra grega brachy, traduzida como "menor", é usada aqui em relação ao tempo e significa temporariamente. Portanto, o texto afirma que, devido à sua humilhação, Jesus temporariamente foi feito menor do que os anjos, e não que Ele tornou-se menos digno do que os seres angélicos.13 Alguns autores interpretam esse texto no sentido de que a glória precedeu o sofrimento. Nesse aspecto, Jesus teria uma glorificação antecipada. Mas, como observa F. F. Bruce, essa não é a leitura natural do texto. O autor de Hebreus põe a glorificação como um evento que seguiu a humilhação de Cristo. Pela primeira vez, o autor cita aqui o nome "Jesus", o que é uma clara demonstração de sua humanização. "O Verbo se fez carne e habitou entre nós" (Jo 1.14). O autor usa o termo grego "graça" (gr. Xaris) pela primeira vez, e o seu sentido é de uma salvação para todos, universal e ilimitada.14 Ele sacrificou-se por todos e, como resultado de sua paixão e exaltação, sua morte é extensiva a todos os homens.15 Adam Clarke (1760-1832), renomado teólogo britânico, vê aqui um paralelo com o cálice da salvação a qual o Senhor Jesus referiu-se em Mateus 26.39:

"Meu Pai, se és possível, passa de mim este cálice. Mas, sem bebê-lo, a salvação haveria sido impossível; portanto, com júbilo o bebeu em lugar de cada alma humana, fazendo desta maneira sacrifício por todo o pecado da totalidade do mundo; e isto Ele fez por graça, misericórdia ou infinita bondade de Deus".

"Porque convinha que aquele, para quem são todas as coisas e me- diante quem tudo existe, trazendo muitos filhos à glória, consagrasse, pelas aflições, o Príncipe da salvação deles" (v. 10). Esse versículo é uma referência à missão salvífica do Filho e faz um paralelo com 2 Coríntios 5.19. O escritor Neil R. Lightfoot observa que alguns comentaristas dizem que o texto quer dizer simplesmente que, através da sua morte, Jesus completou sua obra na terra e que, por isso, teria Ele superado todas as suas limitações. Todavia, Lightfoot destaca que "a palavra aperfeiçoar (traduzida aqui como consagrar), que, com seus cognatos, é característica da epístola, exige mais do que isso. No geral, ela significa concretização ou inteireza; completar algo, pôr em efeito; acabar, por exemplo, uma torre ou obra de arte. Mas o significado aqui é determinado pela Septuaginta, que usa regularmente o termo no Pentateuco para referir-se à consagração dos sacerdotes (:Êx 29.9, 29.33,35, etc.). Da mesma forma que, no Velho Testamento, os sacerdotes eram aperfeiçoados ou consagrados por vários rituais, também Cristo, no Novo, foi aperfeiçoado, consagrado ou qualificado. A ideia é que, em separado do sofrimento, Cristo não poderia ter-se tomado um Líder inteiramente eficaz, perfeito, do seu povo".
"Porque, assim o que santifica como os que são santificados, são todos de um; por cuja causa não se envergonha de lhes chamar irmãos" (v. 11). Aqui, o autor mostra a fonte de santificação do crente: Cristo. É o sangue de Cristo que nos purifica de todo pecado. Posteriormente, ele vai afirmar que, sem a santificação, ninguém verá o Senhor.
"Dizendo: Anunciarei o teu nome a meus irmãos, cantar-te-ei louvores no meio da congregação" (v. 12). O autor novamente recorre a textos messiânicos para corroborar sua argumentação. No primeiro texto, ele usa o Salmo 22.22. Os evangelistas relacionaram esse salmo com os eventos da crucificação (Me 15.34). A identificação de Cristo com a raça humana está claramente demonstrada aqui na argumentação do autor de Hebreus. Jesus identifica-se com seus irmãos.
"E outra vez: Porei nele a minha confiança. E outra vez: Eis-me aqui a mim e aos filhos que Deus me deu" (v. 13). O versículo 13 é uma citação de Isaías 8.17. No contexto do livro de Isaías, o profeta demonstra confiança em Deus, mesmo o povo tendo perdido as esperanças. É exatamente essa mesma confiança que o Filho de Deus demonstra. Por outro lado, o versículo 14 é usado pelo autor para, de forma contundente, demonstrar a plena natureza humana de Cristo.
"E, visto como os filhos participam da carne e do sangue, também ele participou das mesmas coisas, para que, pela morte, aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo" (v. 14). Fritz Laubach destaca:

"Cristo se tornou realmente humano. O Novo Testamento enfatiza: O Filho de Deus não permaneceu na glória eterna, mas de forma misteriosa unificou-se plenamente com nossa natureza humana. Cristo assumiu a nossa natureza, para que nós pudéssemos participar de sua natureza divina (2 Pe 1.4)".

A palavra "aniquilar" não tem o sentido de "destruir" no original grego, mas, sim, o de "tornar inoperante", "anular", "fazer como se não mais existisse". Através da morte e ressurreição de Jesus, Satanás foi destronado (cf. CI 2.15). A consequência imediata da vitória de Jesus está demonstrada no versículo 15.
"E livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão" (v. 15). O cristão não deve mais temer a morte, embora seja ainda necessário passar por ela. Não há mais insegurança e incerteza, já que Jesus, através de sua morte e ressurreição, destronou o poder que ela detinha (1 Co 15.55; 2 Tm 1.1O). Cirilo de Alexandria (378-444 d.C.), em seu comentário de Hebreus, escreveu: "Existindo essencialmente com vida, o Logos Unigênito de Deus uniu-se Ele mesmo à carne terrena e mortal, para que a morte, que perseguia o homem como um animal feroz, soltasse a sua presa".
"Porque, na verdade, ele não tomou os anjos, mas tomou a descendência de Abraão" (v. 16). A morte de Jesus foi pelos homens, e não pelos anjos caídos.
"Pelo que convinha que, em tudo, fosse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote naquilo que é de Deus, para expiar os pecados do povo" (v. 17). A identificação de Jesus com a humanidade é feita pelo autor através da expressão "em tudo, fosse semelhante aos irmãos". Para salvar os homens, era necessário Jesus tornar-se como eles. Evidentemente, essas palavras do autor não devem ser tomadas em seu sentido literal, pois Jesus não cometeu pecados como os demais homens. Aqui, pela primeira vez nessa carta, o autor usa o termo "sumo sacerdote" em referência à pessoa de Jesus. Trata-se de uma prepara¬ ção para o que ele tenciona dizer daqui para frente. Ao comentar esse texto, João Crisóstomo (347-407 d.C.) escreveu:

"Não há nos honrado somente com a fraternidade, senão também de diversas maneiras; assim quis se fazer sumo sacerdote ante o Pai, pois acrescenta: 'A fim ser misericordioso e sumo sacerdote fiel nas coisas que se referem a Deus'. Por isso, afirma - assumiu nossa carne não somente por benevolência, senão para ter misericórdia de nós. Certamente, não existe outra causa da redenção; essa somente! Com efeito, nos vê abatidos na terra, pedidos, tiranizados pela morte, e tem misericórdia"

"Porque, naquilo que ele mesmo, sendo tentado, padeceu, pode socorrer aos que são tentados" (v. 18). Aqui, o autor mostra Jesus como Sumo Sacerdote. Muito mais do que os sacerdotes no Antigo Testamento - que representavam os homens diante de Deus, fazendo intercessão e expiação por seus pecados - Jesus pode socorrer os crentes. Ele conhece nossas vidas e natureza e, por isso, está pronto a interceder por nós.

RETIRADO DO LIVRO:  A supremacia de Cristo.
Fé, esperança e ânimo na carta aos Hebreus.
José Gonçalves


domingo, 7 de janeiro de 2018

Jorge Müller Apóstolo da fé (1805-1898)

Do livro:Heróis da fé.
Orlando Boyer.
Jorge Müller
Apóstolo da fé
(1805-1898)
"Pela fé, Abel... Pela fé, Noé... Pela fé, Abraão..." Assim é que o Espírito Santo conta as incríveis proezas que Deus fez por intermédio dos homens que ousavam confiar unicamente nele. Foi no século XIX que Deus acrescentou o seguinte a essa lista: "Pela fé, Jorge Müller levantou orfanatos, alimentou milhares de órfãos, pregou a milhões de ouvintes em redor do globo e ganhou multidões de almas para Cristo".
Jorge Müller nasceu em 1805, de pais que não conheciam a Deus. Com a idade de dez anos, foi enviado a uma universidade, a fim de preparar-se para pregar o Evangelho, não, porém, com o alvo de servir a Deus, mas para ter uma vida cômoda. Gastou esses primeiros anos de estudo nos mais desenfreados vícios, chegando, certa vez, a ser preso por vinte e quatro dias.
Jorge, uma vez solto, esforçava-se nos estudos, levantando-se às quatro da manhã e estudando o dia inteiro até as dez da noite. Tudo isso, porém, ele fazia para alcançar uma vida descansada de pregador.
Aos vinte anos de idade, contudo, houve uma completa transformação na vida desse moço. Assistiu a um culto onde os crentes, de joelhos, pediam que Deus fizesse cair sua bênção sobre a reunião. Nunca se esqueceu desse culto, em que viu, pela primeira vez, crentes orando ajoelhados; ficou profundamente comovido com o ambiente espiritual a ponto de buscar também a presença de Deus, costume esse que não abandonou durante o resto da vida.
Foi nesses dias, depois de sentir-se chamado para ser missionário, que passou dois meses hospedado no famoso orfanato de A. H. Frank. Apesar de esse fervoroso servo de Deus, o senhor Frank, ter morrido quase cem anos antes (em 1727), o seu orfanato continuava a funcionar com as mesmas regras de confiar inteiramente em Deus para todo o sustento.
Mais ou menos ao mesmo tempo em que Jorge Müller hospedou-se no orfanato, um certo dentista, o senhor Graves, abandonou as Suas atividades que lhe davam um salário de 7.500 dólares por ano, a fim de ser missionário na Pérsia, confiando só nas promessas de Deus para suprir todo o seu sustento. Foi assim que Jorge Müller, o novo pregador, recebeu nessa visita a inspiração que o levou mais tarde a fundar seu orfanato sobre os mesmos princípios.
Logo depois de abandonar sua vida de vícios, para andar com Deus, chegou a reconhecer o erro, mais ou menos universal, de ler muito acerca da Bíblia e quase nada da Bíblia. Esse livro tornou-se a fonte de toda a sua inspiração e o segredo do seu maravilhoso crescimento espiritual. Ele mesmo escreveu: "O Senhor me ajudou a abandonar os comentários e a usar a simples leitura da Palavra de Deus como meditação. O resultado foi que, quando, a primeira noite, fechei a porta do meu quarto para orar e meditar sobre as Escrituras, aprendi mais em poucas horas do que antes durante alguns meses." E acrescentou: "A maior diferença, porém, foi que recebi, assim, força verdadeira para a minha alma". Antes de falecer, disse que lera a Bíblia inteira cerca de duzentas vezes; cem vezes o fez estando de joelhos.
Quando estava ainda no seminário, nos cultos domésticos de noite com os outros alunos, frequentemente continuou orando até a meia-noite. De manhã, ao acordar, chamava-os de novo para a oração, às seis horas.
Certo pregador, pouco tempo antes da morte de Jorge Müller, perguntou-lhe se orava muito.
A resposta foi esta: "Algumas horas todos os dias. E ainda, vivo no espírito de oração; oro enquanto ando, enquanto deitado e quando me levanto. Estou constantemente recebendo respostas.
Uma vez persuadido de que certa coisa é justa, continuo a orar até a receber. Nunca deixo de orar!... Milhares de almas têm sido salvas em respostas às minhas orações... Espero encontrar dezenas de milhares delas rio Céu... O grande ponto é nunca cansar de orar antes de receber a resposta. Tenho orado 52 anos, diariamente, por dois homens, filhos dum amigo da minha mocidade. Não são ainda convertidos, porém, espero que o venham a ser.
Como pode ser de outra forma? Há promessas inabaláveis de Deus e sobre elas eu descanso".
Não muito antes de seu casamento, não se sentia bem com o costume de salário fixo, preferindo confiar em Deus em vez de confiar nas promessas dos irmãos. Deu sobre isso as três seguintes razões:
1) "Um salário significa uma importância designada, geralmente adquirida do aluguel dos bancos. Mas a vontade de Deus não é alugar bancos (Tiago 2.1-6)".
2) "O preço fixo dum assento na igreja, às vezes, é pesado demais para alguns filhos de Deus e não quero colocar o menor obstáculo no caminho do progresso espiritual da igreja".
3) "Toda a idéia de alugar os assentos e ter salário torna-se tropeço para o pregador, levando-o a trabalhar mais pelo dinheiro do que por razões espirituais".
Jorge Müller achava quase impossível ajuntar e guardar dinheiro para qualquer imprevisto, e não ir direto a Deus. Assim o crente confia no dinheiro em caixa, em vez de confiar em Deus.
Um mês depois de seu casamento, colocou uma caixa no salão de cultos e anunciou que podiam deitar lá as ofertas para o seu sustento e que, daí em diante, não pediria mais nada, nem a seus amados irmãos; porque, como ele disse, "Sem me aperceber, tenho sido levado a confiar no braço de carne, mas o melhor é ir diretamente ao Senhor" O primeiro ano findou com grande triunfo e Jorge Müller disse aos irmãos que, apesar da pouca fé ao começar, o Senhor tinha ricamente suprido todas as suas necessidades materiais e, o que foi ainda mais importante, tinha-lhe concedido o privilégio de ser um instrumento na sua obra.
O ano seguinte foi, porém, de grande provação, porque muitas vezes não lhe restava nem um xelim. E Jorge Müller acrescenta que no momento próprio a sua fé sempre foi recompensada com a chegada de dinheiro ou alimentos.

Certo dia, quando só restavam oito xelins, Müller pediu ao Senhor que lhe desse dinheiro.
Esperou muitas horas sem qualquer resposta. Então chegou uma senhora e perguntou: - "O irmão precisa de dinheiro?" Foi uma grande prova da sua fé, porém, o pastor respondeu: - "Minha irmã, eu disse aos irmãos, quando abandonei meu salário, que só informaria o Senhor a respeito das minhas necessidades". - "Mas", respondeu a senhora, "Ele me disse que eu lhe desse isto", e colocou 42 xelins na mão do pregador.
Outra vez passaram-se três dias sem terem dinheiro em casa e foram fortemente assaltados pelo Diabo, a ponto de quase resolverem que tinham errado em aceitar a doutrina de fé nesse sentido. Quando, porém, voltou ao seu quarto achou 40 xelins que uma irmã deixara. E ele acrescentou então: "Assim triunfou o Senhor e nossa fé foi fortalecida".
Antes de findar o ano, acharam-se de novo inteiramente sem dinheiro, num dia em que tinham de pagar o aluguel. Pediram a Deus e o dinheiro foi enviado. Nessa ocasião, Jorge Müller fez para si a seguinte regra da qual nunca mais se desviou: "Não nos endividaremos, porque achamos que tal coisa não é bíblica (Romanos 13.8), e assim não teremos contas a pagar.
Somente compraremos o que pudermos, tendo o dinheiro em mãos, assim sempre saberemos quanto realmente possuímos e quanto temos o direito de gastar".
Deus, assim, gradualmente treinava o novo pregador a confiar nas suas promessas. Estava tão certo da fidelidade das promessas da Bíblia, que não se desviou, durante os longos anos da sua obra no orfanato, da resolução de não pedir ao próximo, e de não se endividar.
Um outro segredo que o levou a alcançar tão grande bênção de confiarem Deus, foi a sua resolução de usar o dinheiro que recebia somente para o fim a que fora destinado. Essa regra nunca infringiu, nem para tomar emprestado de tais fundos, apesar de se ter achado milhares de vezes face a face com as maiores necessidades.
Nesses dias, quando começou a provar as promessas de Deus, ficou comovido pelo estado dos órfãos e pobres crianças que encontrava nas ruas. Ajuntou algumas dessas crianças para comer consigo às oito horas da manhã e a seguir, durante uma hora e meia, ensinava-lhes as Escrituras. A obra aumentou rapidamente. Quanto mais crescia o número para comer, tanto mais recebia para alimentá-las até se achar cuidando de trinta a quarenta menores.
Ao mesmo tempo, Jorge Müller fundou a Junta para o Conhecimento das Escrituras na Nação e no Estrangeiro. O alvo era: 1) Auxiliar as escolas bíblicas e as escolas dominicais. 2) Espalhar as Escrituras. 3) Aumentar a obra missionária. Não é necessário acrescentar que tudo foi feito com a mesma resolução de não se endividar, mas sempre pedir a Deus, em secreto, todo o necessário.
Certa noite, quando lia a Bíblia, ficou profundamente impressionado com as palavras: "Abre bem a tua boca, e te encherei" (Salmo 81.10). Foi levado a aplicar essas palavras ao orfanato, sendo-lhe dada a fé de pedir mil libras ao Senhor; também pediu que Deus levantasse irmãos com qualificação para cuidar das crianças.
Desde aquele momento, esse texto (Salmo 81.10), serviu-lhe como lema e a promessa se tornou em poder que determinou todo o curso da sua vida.
Deus não demorou muito a dar a sua aprovação de alugar uma casa para os órfãos. Foi apenas dois dias depois de começar a pedir, que ele escreveu no seu diário: "Hoje recebi o primeiro xelim para a casa dos órfãos".
Quatro dias depois foi recebida a primeira contribuição de móveis: um guarda-roupa; e uma irmã ofereceu dar seus serviços para cuidar dos órfãos. Jorge Müller escreveu naquele dia que estava alegre no Senhor e confiante em que Ele ia completar tudo.
No dia seguinte, Jorge Müller recebeu uma carta com estas palavras: "Oferecemo-nos para o serviço do orfanato, se o irmão achar que temos as qualificações.
Oferecemos também todos os móveis, etc, que o Senhor nos tem dado. Faremos tudo isto sem qualquer salário, crendo que, se for a vontade do Senhor usar-nos, Ele suprirá todas as nossas necessidades". Desde aquele dia, nunca faltaram, no orfanato, auxiliares alegres e devotados, apesar de a obra aumentar mais depressa do que Jorge Müller esperava.
Três meses depois, foi que conseguiu alugar uma grande casa e anunciou a data da inauguração do orfanato para o sexo feminino. No dia da inauguração, porém, ficou desapontado: nenhuma órfã foi recebida. Somente depois de chegar a casa é que se lembrou de que não as tinha pedido. Naquela noite humilhou-se rogando a Deus o que anelava. Ganhou a vitória de novo, pois veio uma órfã no dia seguinte. Quarenta e duas pediram entrada antes de findar o mês, e já havia vinte e seis no orfanato.
Durante o ano, houve grandes e repetidas provas de fé. Aparece, por exemplo, no seu diário: "Sentindo grande necessidade ontem de manhã, fui dirigido a pedir com insistência a Deus e, em resposta, à tarde, um irmão deu-me dez libras". Muitos anos antes da sua morte, afirmou que, até aquela data, tinha recebido da mesma forma 5.000 vezes a resposta, sempre no mesmo dia em que fazia o pedido.
Era seu costume, e recomendava também aos irmãos, guardar um livro. Numa página assentava seu pedido com a data e no lado oposto a data em que recebera a resposta. Dessa maneira, foi levado a desejar respostas concretas aos seus pedidos e não havia dúvida acerca dessas respostas.
Com o aumento do orfanato e do serviço de pastorear os quatrocentos membros de sua igreja, Jorge Müller achou-se demasiadamente ocupado para orar.
Foi nesse tempo que chegou a reconhecer que o crente podia fazer mais em quatro horas, depois de uma em oração, do que em cinco sem oração. Essa regra ele a observou fielmente durante 60 anos. Quando alugou a segunda casa, para os órfãos de sexo masculino, disse: "Ao orar, estava lembrado de que pedia a Deus o que parecia impossível receber dos irmãos, mas que não era demasiado para o Senhor conceder". Ele orava com noventa pessoas sentadas às mesas:
"Senhor, olha para as necessidades de teu servo..." Essa foi uma oração a que Deus abundantemente respondeu. Antes de morrer, testificou que, pela fé, alimentava 2.000 órfãos, e nenhuma refeição se fez com atraso de mais de trinta minutos.
Muitas pessoas perguntavam a Jorge Müller como conseguia ele saber a vontade de Deus, pois não fazia nada sem primeiro ter a certeza de ser da vontade do Senhor. Ele respondia:
1) "Procuro manter o coração em tal estado que ele não tenha qualquer vontade própria no caso. De dez problemas, já temos a solução de nove, quando conseguimos ter um coração entregue para fazer a vontade do Senhor, seja essa qual for. Quando chegamos verdadeiramente a tal ponto, estamos, quase sempre, perto de saber qual é a sua vontade.
2) "Tenho o coração entregue para fazer a vontade do Senhor, não deixo o resultado ao mero sentimento ou a uma simples impressão. Se o faço, fico sujeito a grandes enganos.

3) "Procuro a vontade do Espírito de Deus por meio da sua Palavra.
É essencial que o Espírito e a Palavra acompanhem um ao outro. Se eu olhar para o Espírito, sem a Palavra, fico sujeito, também, a grandes ilusões.
4) "Depois considero as circunstâncias providenciais. Essas, ao lado da Palavra de Deus e do seu Espírito, indicam claramente a sua vontade.
5) "Peço a Deus em oração que me revele sua própria vontade.
6) "Assim, depois de orar a Deus, estudar a Palavra e refletir, chego à melhor resolução deliberada que posso com a minha capacidade e conhecimento; se eu continuar a sentir paz, no caso, depois de duas ou três petições mais, sigo conforme essa direção. Nos casos mínimos e nas transações da maior responsabilidade, sempre acho esse método eficiente". Jorge Müller, três anos antes da sua morte, escreveu: "Não me lembro, em toda a minha vida de crente, num período de 69 anos, de que eu jamais buscasse, sinceramente e com paciência, saber a vontade de Deus pelo ensinamento do Espírito Santo por intermédio da Palavra de Deus, e que não fosse guiado certo. Se me faltava, porém, sinceramente de coração e pureza perante Deus, ou se eu não olhava para Deus, com paciência pela direção, ou se eu preferia o conselho do próximo ao da Palavra do Deus vivo, então errava gravemente".
Sua confiança no "Pai dos órfãos" era tal, que nem uma só vez recusou aceitar crianças no orfanato. Quando lhe perguntavam porque assumira o encargo do orfanato, respondeu que não fora apenas para alimentar os órfãos material e espiritualmente, mas "o primeiro objetivo básico do orfanato era - afirmava -, e ainda é, que Deus seja magnificado pelo fato de que os órfãos sob os meus cuidados foram e estão sendo supridos de todo o necessário, somente por oração e fé, sem eu nem meus companheiros de trabalho pedirmos ao próximo; por isso mesmo se pode ver que Deus continua fiel e ainda responde às nossas orações".
Em resposta a muitos que queriam saber como o crente pode adquirir tão grande fé, deu as seguintes regras:
1) Lendo a Bíblia e meditando sobre o texto lido, chega-se a conhecer a Deus, por meio de oração.
2) Procurar manter um coração íntegro e uma boa consciência.
3) Se desejamos que a nossa fé cresça, não devemos evitar aquilo que a prove e por meio do que ela seja fortalecida.
"Ainda mais um ponto: para que a nossa fé se fortaleça, é necessário que deixemos Deus agir por nós ao chegar a hora da provação, e não procurar a nossa própria libertação.
"Se o crente desejar grande fé, deve dar tempo para Deus trabalhar."
Os cinco prédios construídos de pedras lavradas e situados em Ashley Hill, Bristol, Inglaterra, com 1.700 janelas e lugar para acomodar mais de 2.000 pessoas, são testemunhas atuais dessa grande fé de que ele escreveu.
Cada uma dessas dádivas (devemo-nos lembrar) Jorge Müller lutou com Deus em oração para obter; orou com alvo certo e com perseverança, e Deus lhe respondeu.
São de Jorge Müller estas palavras: "Muitas repetidas vezes tenho- me encontrado em posição muito difícil, não só com 2.000 pessoas comendo diariamente às mesas, mas também com a obrigação de atender a todas as demais despesas, estando a nossa caixa com os fundos esgotados. Havia ainda 189 missionários para sustentar, cerca de 100 colégios com mais ou menos 9.000 alunos, além de 4.000.000 de tratados para distribuir, tudo sob nossa responsabilidade, sem que houvesse dinheiro em caixa para as despesas".
Certa vez o doutor A. T. Pierson foi hóspede de Jorge Müller no seu orfanato. Uma noite, depois que todos se deitaram, Jorge Müller o chamou para orar dizendo que não havia coisa alguma em casa para comer. O doutor Pierson quis lembrar-lhe que o comércio estava fechado, mas Jorge Müller bem sabia disso. Depois da oração deitaram-se, dormiram e, ao amanhecer, a alimentação já estava suprida e em abundância para 2.000 crianças. Nem o doutor Pierson, nem Jorge Müller chegaram a saber como a alimentação foi suprida. A história foi contada naquela manhã, ao senhor Simão Short, sob a promessa de guardá-la em segredo até o dia da morte do benfeitor. O Senhor despertara essa pessoa do sono, à noite, e mandara que levasse alimentos suficientes para suprir o orfanato durante um mês. E isso sem a pessoa saber coisa alguma da oração de Jorge Müller e do doutor Pierson!
Com a idade de 69 anos Jorge Müller iniciou suas viagens, nas quais pregou centenas de vezes em quarenta e duas nações, a mais de três milhões de pessoas. Recebeu, em resposta às suas orações, tudo de Deus para pagar as grandes despesas. Mais tarde, ele escreveu: "Digo com razão: Creio que eu não fui dirigido a nenhum lugar onde não houvesse prova evidente de que o Senhor me mandara para lá". Ele não fez essas viagens com o plano de solicitar dinheiro para a junta; não recebeu o suficiente nem para as despesas de doze horas da junta. Segundo as suas palavras, o alvo era "que eu pudesse, por minha experiência e conhecimento das coisas divinas, comunicar uma bênção aos crentes... e que eu pudesse pregar o Evangelho aos que não conheciam o Senhor".
Assim escreveu ele sobre um seu problema espiritual: "Sinto constantemente a minha necessidade... Nada posso fazer sozinho, sem cair nas garras de Satanás. O orgulho, a incredulidade ou outros pecados me levariam à ruína. Sozinho não permaneço firme um momento. Que nenhum leitor pense que devido à minha dedicação, eu não me possa 'inchar' ou me orgulhar, ou que eu não possa descrer de Deus!"
O estimado evangelista, Carlos Inglis, contou a respeito de Jorge Müller:
"Quando vim pela primeira vez à América, faz trinta e um anos, o comandante do navio era devoto tal que jamais conheci. Quando nos aproximamos da Terra Nova, ele me disse: 'Sr.
Inglis, a última vez que passei aqui, há cinco semanas, aconteceu uma coisa tão extraordinária que foi a causa de uma transformação de toda a minha vida de crente. Até aquele tempo eu era um crente comum. Havia a bordo conosco um homem de Deus, o senhor Jorge Müller, de Bristol. Eu tinha passado 22 horas sem me afastar da ponte de comando, nem por um momento, quando fui assustado por alguém que me tocou no ombro. Era o senhor Jorge Müller. Houve, então, entre nós o seguinte diálogo:
- Comandante - disse o senhor Müller, - vim dizer-lhe que tenho de estar em Quebec no sábado, à tarde.
Era quarta-feira.
- Impossível - respondi.
- Pois bem, se seu navio não pode levar-me, Deus achará outro meio de transporte.
Durante 57 anos nunca deixei de estar no lugar à hora em que me achava comprometido.
- Teria muito prazer em ajudá-lo, mas o que posso fazer? - Não há meios!
- Vamos aqui dentro para orar - sugeriu.
Olhei para aquele homem e disse a mim mesmo: 'De qual casa de doidos escapou este?' Nunca eu ouvira alguém falar desse modo.
- Sr. Müller, o senhor vê como é espessa esta neblina.
- Não - respondeu ele - os meus olhos não estão na neblina, mas no Deus vivo que governa todas as circunstâncias da minha vida.
O senhor Müller caiu de joelhos e orou da forma mais simples possível. Eu pensei: 'É uma oração como a de uma criança de oito ou nove anos'. Foi mais ou menos assim que ele orou:
'Ó Senhor, se for da tua vontade, retira esta neblina dentro de cinco minutos. Sabes como me comprometi a estar em Quebec no sábado. Creio ser isso a tua vontade."
Quando findou, eu queria orar também, mas o senhor Müller pôs a sua mão no meu ombro e pediu que não o fizesse, dizendo:
- Comandante, primeiro o senhor não crê que Deus faça isso, e, em segundo lugar, eu creio que Ele já o fez. Não há, pois, qualquer necessidade de o senhor orar nesse sentido. Conheço, comandante, o meu Senhor há cinquenta e sete anos e não há dia em que eu não tenha audiência com Ele. Levante-se, por favor, abra a porta e verá que a neblina já desapareceu.
Levantei-me, olhei, e a neblina havia desaparecido. No sábado, à tarde, Jorge Müller estava em Quebec.'"
Para o ajudar a levar a carga dos orfanatos e a apropriar-se das promessas de Deus em oração, lado a lado com ele, Jorge Müller tinha consigo, havia quase quarenta anos, uma esposa sempre fiel. Quando ela faleceu, milhares de pessoas assistiram ao seu enterro, das quais cerca de 1.200 eram órfãos. Ele mesmo, fortalecido pelo Senhor, conforme confessou, dirigiu os cultos fúnebres no templo e no cemitério.
Com a idade de 90 anos pregou o sermão fúnebre da segunda esposa, como o fizera na morte da primeira. Uma pessoa que assistiu a esse enterro, assim se expressou: -"Tive o privilégio, sexta-feira, de assistir ao enterro da senhora Müller... e presenciar um culto simples, que foi, tal- vez, pelas suas peculiaridades, o único na história do mundo: Um venerável patriarca preside ao culto do início ao fim. Com a idade de noventa anos, permanece ainda cheio daquela grande fé que o tem habilitado a alcançar tanto, e que o tem sustentado em emergência, problemas e trabalhos duma longa vida..."
No ano de 1898, com a idade de noventa e três anos, na última noite antes de partir para estar com Cristo, sem mostrar sinal de diminuição de suas forças físicas, deitou-se como de costume. Na manhã do dia seguinte foi "chamado", na expressão de um amigo ao receber as notícias que assim explicam a partida: "O querido ancião Müller desapareceu de nosso meio para o Lar, quando o Mestre abriu a porta e o chamou ternamente, dizendo: 'Vem!'"
Os jornais publicaram, meio século depois da sua morte, a seguinte notícia: "O orfanato de Jorge Müller, em Bristol, permanece como uma das maravilhas do mundo. Desde a sua fundação, em 1836, a cifra que Deus tem concedido, unicamente em resposta às orações, sobe a mais de vinte milhões de dólares e o número de órfãos ascende a 19.935. Apesar de os vidros de cerca de 400 janelas terem sido partidos recentemente por bombas (na segunda guerra mundial), nenhuma criança e nenhum auxiliar foi ferido".

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

REVISTA LIÇÃO 1 PRIMÁRIOS









Para Deus nada é impossível (37). A Encarnação é a prova definitiva e o exemplo desta verdade. Para Maria, estas palavras apoiavam e inspiravam a fé.
Cumpra-se em mim segundo a tua palavra (38). Nunca houve uma consagração a Deus mais humilde ou mais completa. Nem mesmo o conhecimento do estrago que as línguas caluniadoras poderiam fazer à sua reputação esfriou o fervor do seu compromisso. Ela entregou isto a Deus, assim como tudo mais, e o Senhor cuidou dela como somente Ele poderia cuidar.