segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Henrique Martyn- Heróis da Fé.

Luz inteiramente gasta por Deus
(1781-812)

 Ajoelhado na praia da Índia, Henrique Martyn derramava a alma perante o Mestre e orava: "Amado Senhor, eu também andava no país longínquo; minha vida ardia no pecado... desejaste que eu me tornasse, não mais um tição para espalhar a destruição, mas uma tocha brilhando por ti (Zacarias 3.2). Eis-me aqui nas trevas mais densas, selvagens e opressivas do paganismo. Agora, Senhor, quero arder até me consumir inteiramente por ti!"
O intenso ardor daquele dia sempre motivou a vida desse moço. Diz-se que o seu é "o nome mais heróico, que adorna a história da Igreja da Inglaterra, desde os tempos da rainha Elisabete." Contudo, até entre seus patrícios, ele não é bem conhecido.
Seu pai era de físico franzino. Depois de o seu progenitor falecer, os quatro filhos, inclusive Henrique, não tardaram a contrair a mesma enfermidade, a tuberculose.
Com   a   morte   do   pai,   Henrique   perdeu   seu   intenso   interesse pela matemática e se interessou grandemente na leitura da Bíblia. Diplomou-se com mais honras do que todos da sua classe. O Espírito Santo, porém, falou à sua alma: "Buscas grandes coisas para ti. Não as busques!" Acerca dos seus estudos testificou: "Alcancei o ponto mais alto que desejara, mas fiquei desapontado ao ver como, apenas, tinha agarrado uma sombra."
Tinha por costume levantar-se cedo, de madrugada, e andar sozinho, pelos campos para desfrutar de comunhão íntima com Deus. O resultado foi que abandonou para sempre o plano de ser advogado, um plano que, até aí, ainda seguia, porque "não podia consentir em ser pobre pelo amor de Cristo."
Ao ouvir um sermão sobre "O Estado Perdido dos Pagãos" resolveu dar a sua vida como missionário. Ao conhecer a vida abnegada do missionário Guilherme Carey, na sua grande obra na Índia, sentiu-se dirigido a trabalhar no mesmo país.
O desejo de levar a mensagem de salvação aos povos que não conheciam a Cristo, tornou-se como um fogo inextinguível na sua alma pela leitura da biografia de David Brainerd, o qual morrera quando ainda muito jovem, com a idade de vinte e nove anos (sua vida fora gasta inteiramente no serviço de amor intenso aos silvícolas da América do Norte). Henrique Martyn reconhecia que, como foram poucos os anos da obra de David Brainerd, havia também para ele pouco tempo, e se acendeu nele a mesma paixão de gastar-se, inteiramente por Cristo, no breve espaço de tempo que lhe restava. Seus sermões não consistiam em palavras de sabedoria humana, mas sempre se dirigia ao povo como "um moribundo, pregando aos moribundos".
Havia um grande embaraço para Henrique Martyn: a mãe da sua noiva, Lídia Grenfel, não consentiria que eles se casassem, se ele insistisse em levá-la para o estrangeiro. Henrique amava a Lídia e o seu maior desejo terrestre era estabelecer um lar e trabalhar junto com ela na seara do Senhor. Acerca disto, ele escreveu no seu diário: "Continuei uma hora e mais em oração, lutando contra o que me ligava... Cada vez que estava perto de ganhar a vitória, o coração voltava para o seu ídolo, e finalmente, deitei-me sentindo grande mágoa. "Então se lembrou de David Brainerd, o qual negava a si mesmo todos os confortos da civilização, andava grandes distâncias sozinho na floresta, passava dias com fome e depois de assim se esforçar por cinco anos, voltou para falecer tuberculoso nos braços da sua noiva, Jerusa, filha de Jônatas Edwards.
Por fim, Henrique Martyn, também, ganhou a vitória, obedecendo à chamada para sacrificar-se à salvação dos perdidos. Ao embarcar para a Índia, em 1805, escreveu: "Se eu viver ou morrer, que Cristo seja magnificado pela colheita de multidões para Ele".

A bordo do navio, ao afastar-se da sua pátria, Henrique Martyn chorou como uma criança. Contudo nada podia desviá-lo da sua firme resolução de seguir a direção divina. Ele era "um tição arrebatado do fogo" e repentinamente dizia: "Que eu seja uma chama de fogo no serviço divino".
Depois de nove longos meses a bordo, e quando já se achava perto do seu destino, passou um dia inteiro em jejum e oração. Sentia quão grande era o sacrifício da Cruz e como era, igualmente, grande a sua responsabilidade para com os perdidos na idolatria da Índia. Continuava a repetir: "Tenho posto vigias sobre os teus muros, ó Jerusalém; eles não se calarão jamais em todo o dia nem em toda a noite: não descanseis vós os que fazeis lembrar a Jeová, e não lhe deis a Ele descanso, até que estabeleça, e até que ponha a Jerusalém por objeto de louvor na terra!" (Isaías 62.6).
A chegada de Henrique Martyn à Índia, no mês de abril de 1806, foi também em resposta à oração de outros. A necessidade era tão grande nesse país, que os poucos obreiros concordaram em se reunirem em Calcutá, de oito em oito dias, para pedirem a Deus que enviasse um homem cheio do Espírito Santo e poder à Índia. Martyn, logo ao desembarcar, foi recebido alegremente por eles como a resposta às suas orações.
É difícil imaginar o horror das trevas em que vivia esse povo, entre o qual Martyn se achava. Um dia, perto do lugar onde se hospedara, ouviu uma música e viu a fumaça de uma das piras fúnebres de que ouvira falar antes de sair da Inglaterra. As chamas já começavam a subir do lugar onde uma viúva se achava sentada ao lado do cadáver de seu marido morto. Martyn, indignado, esforçou-se, mas não pôde conseguir salvar a pobre vítima.
Em outra ocasião, foi atraído pelo ruído do címbalo, a um lugar onde o povo fazia culto aos demônios. Os adoradores se prostravam perante o ídolo, obra das suas próprias mãos, do qual adoravam e temiam! Martyn sentia-se "mesmo na vizinhança do Inferno".
Cercado de tais cenas, ele se aplicava mais e mais e sem cansar, dia após dia, a aprender a língua. Não desanimava com a falta de fruto da sua  
pregação, reconhecendo ser de maior importância traduzir as Escrituras e
colocá-las nas mãos do povo. Com esse alvo, perseverava no trabalho de tradução, cuidadosamente, aperfeiçoando a obra, pouco a pouco, e parando de vez em quando para pedir o auxílio de Deus.
Como a sua alma ardia no firme propósito de dar a Bíblia ao povo, vê-se no seguinte trecho de um dos seus sermões conservado no Museu Britânico:
"Pensai na situação triste do moribundo, que apenas conhece bastante da eternidade para temer a morte, mas não conhece bastante do Salvador para olhar o futuro com esperança. Não pode pedir uma Bíblia para saber algo sobre o que se firmar nem pode pedir a esposa ou ao filho que lhe leiam um capítulo para o confortar. A Bíblia, ah! é um tesouro que eles nunca possuíram! Vós que tendes um coração para sentir a miséria do próximo, vós que sabeis como a agonia de espírito é mais que qualquer sofrimento do corpo, vós que sabeis que vem o dia em que tendes de morrer, oh! dai-lhes aquilo que lhes será um conforto na hora da morte!"
Para alcançar esse alvo, de dar as Escrituras aos povos da Índia e da Pérsia, Martyn aplicou-se à obra de tradução de dia e de noite, até mesmo quando descansava e quando em viagem. Não diminuía a sua marcha quando o termômetro registrava o intenso calor de 70" nem quando sofria da febre intermitente, nem com o avanço da peste branca que ardia no seu peito.
Como David Brainerd, cuja biografia sempre serviu para inspirálo, Henrique Martyn passou dias inteiros em intercessão e comunhão com o seu "Amado", seu querido Jesus. - "Parece", escreveu ele, "que posso orar para sempre sem nunca cansar. Quão doce é andar com Jesus e morrer por Ele..." Para ele, a oração não era uma formalidade, mas o meio certo de quebrantar os endurecidos e vencer os adversários.
Seis anos e meio depois de ter desembarcado na Índia, enquanto empreendia longa viagem, faleceu com a idade de 31 anos. Separado dos irmãos, do resto da família, com a noiva esperando-o na Inglaterra, e cercado de perseguidores, foi enterrado em lugar desconhecido.
Era grande o ânimo, a perseverança, o amor, a dedicação com que trabalhava na seara do seu Senhor! O zelo ardeu até ele se consumir neste curto espaço de seis anos e meio. É-nos impossível apreciar quão grande foi a sua obra feita em tão poucos anos. Além de pregar, conseguiu traduzir porções das Sagradas Escrituras para as línguas de uma quarta parte de todos os habitantes do mundo. O Novo Testamento em hindu, hindustão e persa e os Evangelhos em judaico-persa são apenas uma parte das suas obras.
Quatro anos depois da sua morte, nasceu Fidélia Fiske, no sossego da Nova Inglaterra. Quando ainda aluna na escola, leu a biografia de Henrique Martyn. Andou quarenta e cinco quilômetros de noite, sob violenta tempestade de neve, para pedir à sua mãe que a deixasse ir pregar o Evangelho às mulheres da Pérsia. Ao chegar à Pérsia reuniu muitas mulheres e lhes contou o amor de Jesus, até que o avivamento em Oroomiah se tornou em outro Pentecoste.
Se Henrique Martyn, que entregou tudo para o serviço do Rei dos reis, pudesse visitar a Índia, e a Pérsia, hoje, quão grande seria a obra que encontraria, obra feita por tão grande número de fiéis filhos de Deus nos quais ardeu o mesmo fogo pela leitura da biografia desse pioneiro.

Retirado deste livro:
Heróis da Fé
Vinte homens extraordinários que incendiaram o mundo.
Orlando S. Boyer

domingo, 3 de setembro de 2017

Noé

Tal como no caso de Enoque, as Escrituras não declaram especificamente que Noé “orou”. Entretanto, as buscas espirituais de Noé são identificadas nos mesmos termos usados para Enoque: “Noé andava com Deus” (Gn 6.9).
A narrativa bíblica sobre Noé não deixa dúvidas de que ele manteve um contato e uma comunhão vitais com Deus. Várias vezes as Escrituras indicam que Deus falou com Noé (cf. Gn 6.13; 7.1). Noé, por sua vez, respondia com uma implícita obediência: “E fez Noé conforme tudo o que o Senhor lhe ordenara” (Gn 7.5).
Há nisso uma profunda lição para todo crente que deseja a comunhão da oração com Deus: ouvir algo da parte Deus implica na disposição de lhe obedecer. Muitas vezes a razão para o silêncio de Deus indica que o coração do pedinte não está compromissado com Ele. Em sua geração, apenas Noé tinha o coração voltado para Deus. Mas quanto a seus contemporâneos, o caso era bem diferente: “E viu o Senhor que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente” (Gn 6.5). Não admira, pois, que Deus não pudesse falar a tais pessoas. A oração era para elas algo estranho. Deus não estava presente em seus pensamentos. A ideia de andar com Deus, viver para Deus e relacionar-se com Deus era, a seus olhos, pura insensatez. E esse tipo de concepção ainda é comum a milhares de pessoas hoje em dia. Isso nos faz lembrar as palavras de Jesus:
E, com o foi nos dias de Noé, assim será também a vinda do Filho do Homem. Porquanto, assim como, nos dias anteriores ao dilúvio, comiam, bebiam, casavam e davam-se em casamento, até ao dia em que Noé entrou na arca, e não o perceberam, até que veio o dilúvio e os levou a todos, assim será também a vinda
do Filho do Homem (Mt 24.37-39).

Na narrativa sobre Noé, temos a primeira menção a um altar na Bíblia: “E edificou Noé um altar ao Senhor... e ofereceu holocaustos sobre o altar” (Gn 8.20). O altar de Noé introduziu a prática da construção de altares. Os holocaustos significavam dedicação e exaltação a Deus. O altar denotava relacionamento e adoração; estava vinculado essencialmente à oração. Essa conexão reaparece em Apocalipse 8.3,4, onde lemos: “E veio outro anjo e pôs-se junto ao altar, tendo um incensário de ouro; e foi-lhe dado muito incenso para o pôr com as orações de todos os santos sobre o altar de ouro que está diante do trono. E a fumaça do incenso subiu com as orações dos santos desde a mão do anjo até diante de Deus”.
A respeito desse altar, mencionado no Apocalipse, W. Shaw Caldecott faz a seguinte observação:
Ele é descrito como ‘o altar de ouro que estava diante do trono’, e com o fumo de seu incenso subiram diante de Deus as orações dos santos. Esse simbolismo está em harmonia com a declaração [de Lucas] de que, enquanto os sacerdotes queimavam incenso, ‘toda a multidão do povo permanecia da parte de fora, orando’ (Lc 1.10). Desta forma, tanto a história quanto a profecia confirmam a verdade permanente de que a salvação é pelo sangue do sacrifício, tornando-se disponível mediante as orações de santos e pecadores, oferecidas por um grande Sumo Sacerdote (International Standard Bible Encyclopedia, vol. 1, Grand Rapids: Wm.
B. Eerdmans Publishing Co., 1939, p. 112).

Por revelação divina, Noé percebeu que sua aceitação por parte de Deus e sua oração eficaz dependiam de um sacrifício de sangue. O mesmo princípio tem aplicação em nossos dias, correspondendo ao sangue que foi derramado de uma vez por todas no Calvário. Eis a razão pela qual Jesus disse: “Ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14.6). Quando oramos “no nome de Jesus” somos contemplados não apenas com o poder e a glória de Jesus Cristo, mas também com o acesso e a aceitação decorrentes do sacrifício divino e do sangue derramado pelo Filho de Deus. PelaNoé entendeu esse princípio quando construiu seu altar e efetuou sobre ele seu sacrifício (cf. Hb 9.21; 10.19).


Extraído do livro Teologia bíblica da oração.

Robert L. Brandt e Zenas J. Bicket
Todos os direitos reservados. Copyright © 2007 para a língua portuguesa da Casa
Publicadora das Assembléias de Deus. Aprovado pelo Conselho de Doutrina.
Título do original em inglês: The Spirit Help Us Pray
Logion Press, Springfield, Missouri
Primeira edição em inglês: 1993
Tradução: João Marques Bentes
Revisão: Gleyce Duque
Editoração: Flamir Ambrósio

Enoque

Embora as Escrituras não afirmem especificamente que Enoque tenha orado, elas indicam um relacionamento superior entre ele e Deus: “Andou Enoque com Deus” (Gn 5.22, grifo do autor). A palavra hebraica halak, aqui traduzida por “andou”, contem a ideia de seguir, aderir, isto e, ser intimo na comunhão com Deus.
A comunhão de Enoque com Deus era tanta que resultou na sua translação: “E andou Enoque com Deus; e não se viu mais, porquanto Deus para si o tomou” (Gn 5.24).
O autor da Epistola aos Hebreus expande a referencia no Genesis, ao dizer:
Pela fé, Enoque foi trasladado para não ver a morte e não foi achado, porque Deus o trasladara, visto como, antes da sua trasladação, alcançou testemunho de que agradara a Deus. Ora, sem fé é impossível agradar-lhe, porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que  ele existe e  que é  galardoador dos  que  o  buscam  (Hb 11.5,6).
O testem unho de  Enoque ter agradado a Deus  está claramente  vinculado  à  sua  fé.  É  razoável  concluir que  Enoque  acreditava que Deus  era  real,  a um  nível tal que se via  compelido  a  buscá-lo diligente e insistentemente em oração e com unhão. E foi galardoado com sua remoção física deste mundo, sem nunca experimentar a morte.  Suas  orações  conduziram -no  diretamente ao Céu e também à galeria de heróis da fé (Hb 11), para que todo mundo  possa  vê-lo  e imitá-lo.




Extraído do livro Teologia bíblica da oração.

Robert L. Brandt e Zenas J. Bicket
Todos os direitos reservados. Copyright © 2007 para a língua portuguesa da Casa
Publicadora das Assembléias de Deus. Aprovado pelo Conselho de Doutrina.
Título do original em inglês: The Spirit Help Us Pray
Logion Press, Springfield, Missouri
Primeira edição em inglês: 1993
Tradução: João Marques Bentes
Revisão: Gleyce Duque

Editoração: Flamir Ambrósio