terça-feira, 20 de março de 2018

UM ILUMINADO NÃO PODE ESTAR NAS TREVAS



- Tendo sido iluminado (particípio grego: photisthentas). Primeiramente, o autor de Hebreus mostra que o apóstata é alguém que anteriormente foi iluminado, mas renegou a sua nova vida em Cristo. O expositor Neil R. Lightfoot observa que essa iluminação é uma referência à conversão.  De fato, o autor novamente usa esse mesmo termo em Hebreus 10.32 para referir-se à experiência da conversão: "Lembrai-vos, porém, dos dias anteriores, em que, depois de iluminados, sustentastes grande luta e sofrimentos" (ARA). Aqui, o iluminado era alguém que se convertera e que, portanto, fazia parte da igreja. Por outro lado, o escritor Gerald F. Hawthorne busca na patrística, e não no contexto imediato de Hebreus, que "iluminados" seria uma referência ao sacramento do batismo, e não à conversão. Do mesmo modo, ele defende que a expressão "provaram o dom celestial" significaria que os crentes sobre os quais o autor de Hebreus refere-se teriam participado da ceia. A fraqueza dessa tese é que ela exporta para dentro do texto sentidos que são estranhos ao mesmo. O expositor Leon Morris destaca que, embora o termo "iluminado" seja usado neste sentido no segundo século, esse é, todavia, um uso tardio. Segundo Morris, o termo é mais bem interpretado "à luz do uso geral pelo qual aqueles admitidos à fé cristã são trazidos para aquela luz que é 'a luz do mundo' (Jo 8; 12; ver 2 Co 4.6, 2 Pe 1.19)". Assim como Morris, o Comentário Bíblico São Jerônimo destaca que o entendimento mais natural é ver "iluminados" como uma referência à iluminação dada pela fé em Cristo (2 Co.4.6) e "provaram o dom celestial" como uma metáfora de provar a salvação trazida por Jesus (Rm 5.15; 2 Co 9.15). Esse sentido é visto também pelo expositor William Lane, que destaca: "essas pessoas [Hb 6.4-6] haviam testemunhado 'o fato de que a salvação era a realidade inquestionável em suas vidas"'.

Extraído do livro: A supremacia  de  Cristo , Fé, esperança  e ânimo na carta aos Hebreus.
José Gonçalves.

SENTINDO O GOSTO DO CÉU, PORÉM PROIBIDO DE ENTRAR NELE


A posição do reformador francês, João Calvino, é a mais radical e a mais difícil de enquadrar-se no contexto de Hebreus 6. Calvino cria que esse texto estaria se referindo aos réprobos, aqueles que, mesmo não tendo direito à vida eterna, Deus tocava-os com "o sabor de sua graça", "iluminava suas mentes com lampejos de sua luz" e, em alguma medida, "gravava a sua palavra" em seus corações. A fé deles, portanto, era apenas temporária e desvanecente.  Mas como explicar por que Deus, sendo amor e querendo salvar a todos (Jo 3.16; 1.29; 1 Tm 2.4; 1 Jo 2.2), permitiu a esse "réprobo", já condenado ao Inferno, experimentar o sabor da salvação se Ele não tencionava salvá-lo?  Deus não seria acusado de injusto se assim procedesse? Os que acreditam na segurança condicional do crente argumentam que esse pensamento, longe de ser uma defesa de soberania de Deus, soa mais como uma distorção do seu caráter e uma negação explícita do seu amor. Em virtude daquilo que explicitamente ensina o contexto dessa passagem, essa interpretação há muito vem perdendo fôlego entre os intérpretes.


Extraído do livro: A supremacia  de  Cristo , Fé, esperança  e ânimo na carta aos Hebreus.
José Gonçalves.



APOSTASIA, SALVAÇÃO E REGENERAÇÃO


Se, por um lado, a teoria do "caso hipotético" não pode ser defendida biblicamente, por outro, é biblicamente inconcebível alguém ser crente e, ainda assim, não ser regenerado, como defende Wayne Grudem.  O escritor John MacArthur debate-se em contorções teológicas tentando provar que essas pessoas as quais o autor de Hebreus refere-se não eram crentes de verdade. Todavia, ele mesmo demonstra não ter certeza se o texto de Hebreus 6.4-6 exclui os verdadeiros crentes.  Essa também parece ser a opinião de Judith M. Gundry-Volf, que explica o abandono da fé em termo de "uma falsa profissão". De forma semelhante, o teólogo Kenneth S. Wuest, por exemplo, esforça-se para tentar provar que o autor de Hebreus estaria se referindo ao "judeu não-salvo". Se esse fosse o caso, restaria explicar por que o autor de Hebreus demonstrou tanta preocupação com esse "não-salvo" perder algo que ele nem mesmo tinha: a salvação.
Deve ser ressaltado aqui que o apóstolo Paulo fala da apostasia no contexto da parousia (2 Ts 2.3), que precede o aparecimento do Anticristo. O mesmo fato é aludido no contexto da igreja em 1 Tm 4.1: "Mas o Espírito expressamente diz que, nos últimos tempos, apostatarão alguns da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores e a doutrinas de demônios". Nesse último texto, fica claro que a apostasia é algo que acontece dentro do contexto da igreja.



Extraído do livro: A supremacia  de  Cristo , Fé, esperança  e ânimo na carta aos Hebreus.
José Gonçalves.