Extraído do livro: A obra da Salvação.
Autor da obra: Claiton Ivan Pommerening.
Fé e
arrependimento são condições essenciais para a salvação. Trata-se de duas
operações conjuntas e sinérgicas em que o homem reage positivamente à ação do
Espírito Santo, produzindo nele o pesar e a repugnância ao pecado, tão
necessário à vida nova em Cristo. O Espírito Santo também produz
simultaneamente a fé, sem a qual o indivíduo não poderia crer na obra salvadora
de Cristo.
A FÉ COMO UM DOM DE DEUS E COMO
RESPOSTA DO SER HUMANO
O homem é um ser finito que vive em constante busca pelo infinito
e, devido à sua finitude, ele toma consciência de suas necessidades físicas, psíquicas e sociais e, a partir disso, inclina-se em
busca de sentido para a vida. Nessa busca de sentidos, a razão transcende os
limites de sua finitude e abre-se para a experiência e relacionamento com um
ser superior, ou seja, com Deus.137
Nesse relacionamento, observa-se um ato
de fé no qual o ser humano acredita e confia em uma força ou ser superior que
os olhos físicos não contemplam, mas que se legitima pela fé, pois essa crença
não se baseia apenas em sua razão ou vontade, mas também na experiência vivida
com Deus, que o leva a reconhecer sua incapacidade de salvar-se por seus
próprios méritos e reconhecer a Cristo como seu Salvador. Essa fé, acompanhada
de uma atitude de conversão,138 concretiza a certeza da existência desse Deus. Isso é
denominado fé salvífica.
No Antigo Testamento, o termo fé é
encontrado apenas por duas vezes; em Dt 32.20: “[...] geração de perversidade,
filhos em quem não há lealdade” (emun) e em Hc 2.4: “[...] o justo, pela
sua fé, viverá” (emunah). Nesses dois casos, a maioria dos eruditos
concorda que os termos hebraicos significam fidelidade e não fé (ainda que a
fidelidade origine-se apenas de uma atitude correta para com Deus, ficando
pressuposta a fé).139 Isso não significa
que a fé não seja elemento importante no ensino do Antigo Testamento, pois,
ainda que a palavra não seja frequente, a ideia está presente em todo o texto.
O
vocábulo emunah traz em si diversos significados que se relacionam com a
fé, tais como: veracidade, sinceridade, honradez, retidão, fidelidade,
lealdade, seguridade, crédito, firmeza e verdade. Diante de todos esses
significados, podemos compreender melhor as razões pelas quais Deus diz que o
justo viverá pela “emunah”.
Nos
escritos veterotestamentários, as verdades acerca da salvação são declaradas de
várias formas. Em algumas delas, chega-se a entender que se espera que os
homens sejam salvos à base de suas obras. Porém, a passagem registrada em Sl
26.1 coloca a questão em sua correta perspectiva: “Faze-me Justiça, Senhor,
pois tenho andado na minha integridade, e confio no Senhor, sem vacilar” (ARA).
O salmista apela para a sua integridade; isso, contudo, não significa que ele
estivesse confiando em si mesmo ou em suas ações. Sua confiança estava
depositada em Deus, e sua integridade era o reflexo dessa confiança.
No
Novo Testamento, a palavra fé é amplamente utilizada. O substantivo pistis e
o verbo pisteuo ocorrem ambos mais de 240 vezes, enquanto que o adjetivo
pistos ocorre 67 vezes. Essa ênfase sobre
a fé deve ser vista
em contraste com a obra Salvadora de Deus em Jesus Cristo.140 O pensamento de que o Senhor Deus enviou o seu Filho para
salvar o mundo é central, e a fé é a atitude mediante a qual o homem abandona
toda a confiança e também seus próprios esforços para obter a salvação.
Trata-se de uma atitude de completa confiança em Cristo, de dependência
exclusiva dEle, a respeito de tudo quanto está envolvido na salvação. Quando o
carcereiro filipense perguntou o que deveria fazer para ser salvo, Paulo e Silas
responderam sem qualquer hesitação: “Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo,
tu e a tua casa” (At 16.31).
A fé
para a salvação é uma atitude do intelecto e do coração para com Deus em que o homem
abandona toda a confiança em seus esforços
de religiosidade, de piedade, de bondade ou de moralidade para obter a
salvação (Gl 2.16) e confia completa e exclusivamente na obra salvadora de
Cristo (At 16.30) operada na cruz. Portanto, a fé não consiste apenas em crer
em algumas coisas como sendo verdadeiras, mas também em confiar na pessoa de
Cristo (Jo 3.18). A fé para a salvação é um dom de Deus (Ef 2.8), cujo autor é
Cristo (Hb 12.2); ela tem sua origem quando se ouve a Palavra de Deus (Rm
10.17) e é imprescindível para a pessoa apropriar-se da salvação (Jo 5.24).
Embora seja um dom de Deus, ela precisa ser exercida ou manifestada para a
obtenção da salvação.
O verbo pisteuo indica que a fé
diz respeito a fatos. Jesus já havia dito isso com clareza para os judeus:
“[...] porque, se não crerdes que eu sou, morrereis em vossos pecados” (Jo
8.14). Portanto, uma fé que não se encontra
acompanhada de um genuíno arrependimento não pode ser considerada autêntica. Isso nos é
afirmado em Tiago 2.19. A palavra característica para indicar a fé salvadora é
aquela em que o verbo pisteuo é acompanhado pela preposição eis.
Essa construção significa literalmente “crer dentro”, ou seja, indica uma fé
que tira o homem de si mesmo e coloca- o em Cristo.141 O homem que confia nesse sentido permanece em Cristo e
Cristo nele (Jo 15.4).
A fé não consiste meramente em aceitar
certas coisas como legítimas, mas, sim, em confiar
numa Pessoa, e essa Pessoa é o Senhor Jesus Cristo. Ao compararmos o Antigo e o Novo Testamento, observa-se que a exigência básica para a salvação é a
atitude correta para com Deus através da fé (Sl 37.3-5).
Existe, também, a dimensão humana da
fé, ou seja, a fé natural. Sobre isso, Tillich pondera que a fé é a ação mais
profunda e integral do espírito humano e afirma não ser possível separar a fé e
a pessoa em sua totalidade, pois a mesma transcende e é percebida em cada uma
das dimensões da vida humana, perpassando por seus ambientes sociais. Ele
pondera ainda que o acesso à dimensão espiritual seria facultativa ao ser
humano.142 A fé natural é a aceitação intelectual de certas
verdades acerca de Deus, mas que não é
acompanhada por uma vida condizente com o evangelho (Tg 2.17). Essa fé é
vivenciada por todas as pessoas que até acreditam em Deus, que entendem que Ele
fez todas as coisas, que acreditam que o sol levanta-se pela manhã por provisão
dEle, mas, mesmo assim, não dão o passo de salvação necessário. A Bíblia afirma
que até os demônios creem e estremecem (ver Tg 2.19). Essas pessoas até podem
estar cientes da vida eterna, mas, ainda assim, não aceitam o sacrifício de
Cristo que lhes beneficia com a salvação.
A fé salvadora apodera-se do
poder infinito do amor. Ela é a confiança em Deus e crê que Ele ama a cada um e
sabe o que é melhor para nós; assim, em lugar de nossos próprios caminhos, ela
leva-nos a preferir os do Senhor; ao invés de nossa ignorância, aceitamos sua
sabedoria; em lugar de nossa fraqueza, recebemos sua força; em lugar de nossa
pecaminosidade, sua justiça. É a fé que nos habilita a ver para além do
presente, a contemplar o grande porvir em que tudo quanto nos traz perplexidade hoje será
esclarecido; a fé aceita Cristo como nosso mediador à destra de Deus.
A salvação é pela graça, mas a fé é o
elemento indispensável (Ef 2.8-9). Ela é a porta de entrada das bênçãos oriundas
da salvação, que são: a justificação, a regeneração, a reconciliação, a adoção,
o perdão, a santificação, a glorificação e a vida eterna. Além dos benefícios
inerentes à salvação, a fé ainda permite: a cura de enfermidades (Mc 16.18; Tg
5.15); o batismo no Espírito Santo (Mc 16.17); a vitória contra o mundo (1 Jo
5.4), a carne (Gl 2.20) e o Diabo (1 Pe 5.8-9); a paciência (Tg 1.3); e a
proteção contra os dardos inflamados do maligno (Ef 6.16), que tentam colocar
dúvidas e ferir a imagem de Deus em nós.
Não é suficiente crer a respeito de
Deus. Precisamos crer nEe, pois a única fé que nos amparará é aquela que admite
Cristo como nosso salvador pessoal. A fé não é uma mera opinião à fé salvadora,
mas, sim, uma combinação na qual os que recebem Cristo conectam-se em aliança
com Deus. Fé genuína é vida, e ter uma fé viva significa aumento de vigor,
possuir uma firme confiança em Deus e em suas promessas. Fé não é sentimento;
antes, é o “firme fundamento das coisas que se esperam e a prova das coisas que
se não veem” (Hb 11.1).
A fé genuína tem seu fundamento nas promessas
registradas nas Escrituras.
A fé é, sem dúvida, um dos mais
importantes conceitos de toda a Bíblia Sagrada. Em toda a parte, ela é
requerida, e sua importância é insistentemente salientada. Fé significa
lançar-se sem reservas nas mãos misericordiosas de Deus, abandonando, assim,
toda a confiança em nossos próprios recursos. Fé significa apegar-se às
promessas de Deus em Cristo, dependendo inteiramente da obra de Cristo
referente à salvação, bem como do poder do Espírito Santo de Deus, que habita
no crente para dEle receber fortalecimento diário. Fé implica em completa
dependência de Deus e plena obediência a Ele.
ARREPENDIMENTO,
UMA METANOIA DO ESPÍRITO
No Antigo Testamento, arrependimento
significa girar ou retornar e dedicar-se para Deus ao abandonar o pecado,
voltando-se para Ele de todo o coração, alma e forças (Ne 1.9; Is 19.22).143 Essa é a maneira característica do Antigo Testamento para
expressar o arrependimento do homem para com Deus. No Novo Testamento,
significa uma mudança (metanoia) de mente e transformação de
pensamentos, de consciência e de atitudes, abandonando o pecado e voltando-se
para Deus, no sentido de dar meia volta na direção em que se estava e tomar
outra direção. No arrependimento, sente-se tristeza pelo pecado (2 Co 7.10) e é
necessário o seu abandono para abraçar a vontade de Deus. O arrependimento “é a
negação de uma direção de pensamento e ação, e a afirmação da direção oposta.
Aquilo que se nega é o cativeiro [do pecado], e aquilo que se afirma é o novo
ser criado pela presença de Deus”.144
O arrependimento livra-nos das amarras
do pecado e da culpa que escravizam e tiram a alegria
de viver; o arrependimento leva-nos
a experimentar cura substancial dos pensamentos e da consciência
cauterizada pelo pecado (1 Tm 4.2). Leva, ainda, a desenvolver satisfação e uma
autoestima sadia, sem orgulho nem autodesmerecimento, resultando em alegria e
paz no coração.
Jesus afirmou que, para fazer parte do
seu Reino, era necessário o arrependimento (Mt 4.17). Arrependimento não é uma reforma
apenas, mas também uma entrega total à ação do Espírito Santo para promover as
mudanças e transformações mais profundas na alma humana. Zaqueu teve um
arrependimento tão genuíno que prometeu devolver quatro vezes mais a quem ele
havia roubado (Lc 19.8). Arrependimento é diferente de remorso. Este é
momentâneo e passageiro, e aquele deve atingir o mais escuro compartimento do
coração humano numa mudança radical de atitudes.
O arrependimento é acompanhado do
sentimento de culpa e do reconhecimento da falta praticada (Sl 51.1-4); de um
sincero pedido de perdão (Sl 51.10-12); do abandono do erro (Pv 28.13) e da
produção de frutos de arrependimento (Mt 3.8; At 26.20). O arrependimento está
incluso no processo de conversão e abrange o ser humano por inteiro: o
intelecto (Mt 21.30), as emoções (Lc 18.13) e a vontade (Lc 15.18-19).
Portanto, a conversão é uma ruptura com antigas tradições e modos de vida
abomináveis e pecaminosos.
Para que haja perdão de pecados, é
necessário arrependimento (Lc 24.47). Isso implica em nascer de novo e converter-se completamente para Deus. Não se
trata apenas de uma decisão da mente, mas envolve o ser humano por inteiro. O
desejo de Deus é sempre perdoar e amar, e sua atitude em favor da humanidade
morrendo numa cruz confirma-nos esse desejo; contudo, a retribuição do homem para com o amor de Deus foi a desobediência e o pecado, e,
depois da Queda, não havia possibilidade de perdão para a humanidade caída, a
não ser que alguém que fosse superior ao homem pudesse sofrer o castigo em seu
lugar. Após a queda do ser humano, o mundo estava coberto de destruição e ira;
no entanto, não foi a ira que levou Jesus à cruz, mas o seu indescritível amor.
Os efeitos do processo Redentor
de Cristo são reais e verdadeiros. Isso pode ser confirmado não apenas a
partir da Bíblia, mas também porque os efeitos são vistos na vida de muitos, e
isso nos garante que o arrependimento, a confissão e o perdão são realidades
que nos transformam. Sem a cruz, a confissão seria apenas mais um tipo de
terapia; ela, porém, é muito mais, na medida em que promove mudanças reais em
nosso relacionamento com Deus, com o próximo e conosco; é um meio de cura e
transformação para o/a homem/mulher interior.145
A proclamação do evangelho através da
pregação é um método sublime de convencer o pecador ao arrependimento. A
mensagem mais clássica quanto a isso é o primeiro sermão de Pedro, quando foram
batizadas 3 mil pessoas. Sua mensagem foi jogar em rosto (imputação de culpa) o
que haviam feito com Cristo e seus milagres, sofrimento, morte, ressurreição e glorificação. Porém, o ponto central foi
sua morte e ressurreição. Como fruto desse primeiro sermão, os ouvintes foram
compungidos (At 2.37 – ARA), aflitos (NVI) — em outras traduções, poderia ser tocados,
feridos, picados. Essa palavra provém do grego nusso,
que significa espetar, como se um punhal tivesse atravessado o coração
deles. Um desespero
santo tomou conta
do público, mas Pedro não lhes deu nenhum consolo passageiro, nenhuma
promessa de vitória fácil. Veio, sim, a proclamação para o arrependimento (At
2.38), que, tendo sido aceita pelos presentes, serviu de base para o batismo, o
consolo permanente.
Para dar o extraordinário
efeito de arrependimento nos ouvintes, como relatado em vários textos de Atos
dos Apóstolos, o kerygma (pregação) apostólico “consistia de três
partes: 1) uma proclamação da morte, ressurreição e exaltação de Jesus; 2) a
consideração de Jesus como Senhor e também como Cristo; e 3) uma convocação ao
arrependimento e a receber perdão de pecados. Assim, o kerygma, em sua
plenitude, reunia uma proclamação histórica, uma consideração teológica e uma
convocação ética.”146
O resultado dessa pregação, além do
arrependimento verificado, foi a confissão de pecados (At 2.37). A Bíblia
admoesta-nos a confessar nossos pecados uns aos outros e a orar uns pelos
outros (Tg 5.16). Ela afirma-nos também que há um só mediador entre Deus e os
homens, Jesus Cristo, homem (ver 1 Tm 2.5). Ambas as instruções são encontradas
na Bíblia, e uma não exclui a outra. A Igreja de Cristo é denominada como uma
comunhão de santos, mas também uma comunhão de pecadores, no sentido de que
ninguém ainda alcançou a plenitude da santidade, ou seja, todos ainda carecem
de progresso na caminhada cristã.
O arrependimento atesta o
reconhecimento não apenas do pecado, mas também da condição pecaminosa em que
se encontra o homem. Contudo, remorso apenas não lhe garante vitória sobre o
pecado — nesse sentido, o ato da confissão é de suma importância. Nele
expõem-se as limitações a um conselheiro espiritual, e juntos agregam-se forças
mútuas no desejo de prosseguir. Não confessar as falhas aos outros indica uma
indisposição ao desejo real de mudança, especialmente quando não se consegue
obter vitória sozinho sobre determinadas práticas nocivas. A confissão denota
aceitação do julgamento e do castigo na intenção de receber perdão e esperança
de transformação. Nesse processo, sente-se que a culpa foi superada, e uma nova
coragem de ser torna-se possível.
Confessar nossas necessidades diante de
irmãos e irmãs que nos orientarão no caminho correto dá-nos a certeza de que
não estamos sozinhos. O orgulho e o medo que se apega em nós quando
pensamos em confissão apega-se também aos outros; contudo, somos todos igualmente
pecadores e, no ato da confissão mútua, o poder de cura é liberado, e nossa
condição humana já não é mais negada, e sim transformada.147 O indivíduo que conhece, mediante a confissão privada, o
perdão e o livramento de persistentes hábitos importunadores regozija-se
grandemente nessa prova da misericórdia divina.
Sempre
existirão áreas na vida do cristão que não foram submetidas ao senhorio de
Cristo e que, portanto, não passaram pelo processo de arrependimento (Hb
12.17). Por isso, a Bíblia enfatiza a necessidade de constantemente
julgarmo-nos a nós mesmos (1 Co 11.31) e percebermos aquilo que sorrateiramente
contamina o coração e que quer afastar-nos de Deus, pois “enganoso é o coração,
mais do que todas as coisas, e perverso; quem o conhecerá?” (Jr 17.9).
A FÉ E O ARREPENDIMENTO SÃO AS
RESPOSTAS À SALVAÇÃO
Conversão não é um evento momentâneo; é, na maioria
dos casos, um longo processo que se estende de forma
inconsciente muito antes de romper na consciência, dando a impressão de uma
situação inesperada que se apodera da totalidade da pessoa. 148 Existem relatos no Novo Testamento, como os da conversão de
Paulo, que forneceram o modelo para essa compreensão de conversão. Observamos o
impacto do primeiro momento (At 9.1), mas com desdobramentos constantes no
desenvolvimento do processo.
A
salvação é pela graça através da fé, que é a condição necessária para a
obtenção da salvação. Sem ela (a fé), não se crê no sacrifício completo de
Cristo e, portanto, podem surgir duas situações: a primeira é que a pessoa não
compreende a necessidade de salvação e, por isso, não coloca sua fé em ação; e
a segunda é o equívoco de tentar ganhar a salvação por méritos próprios.
Conjuntamente, operam a fé exclusiva em Jesus para a salvação
e, como consequência da fé, o
Espírito Santo convence a pessoa do pecado, levando-a ao arrependimento.
Visto
que a natureza pecaminosa é o estado próprio do ser humano, ele torna-se
incapaz de reconhecer o estado pecaminoso em que se encontra e, devido a essa
inconsciência, carece de uma orientação externa que produza o desejo de arrependimento
e conduza-o a tomar essa atitude. Nesse sentido, até mesmo o desejo de
arrepender-se já é, por si só, obra do Espírito Santo no coração do homem.
O arrependimento muda a forma de
enxergar a realidade, além de produzir uma transformação profunda através da
qual se experimenta um sentimento ímpar de liberdade. O arrependimento genuíno
tem o poder de modificar as atitudes do coração da alma e da mente, tirando-as
do caminho de morte e direcionando-as para um caminho de vida abundante. Todavia, esse poder não está presente em nossas vontades
e desejos, mas, sim, em Deus, e somente Ele é capaz de realizar essa mudança.
A
mudança que Deus produz no ser humano a partir de sua atitude de arrependimento
não é uma mudança permanente. O arrependimento de hoje não lhe garante mudanças
e transformações infindáveis. Enquanto estiver nesta terra, o homem estará
cativo à sua natureza pecaminosa. Alguém disse uma vez que “o ser humano não é
pecador porque peca, mas peca por que é pecador”, e a libertação dessa natureza
está condicionada a uma dependência contínua da ação do Espírito Santo de Deus
em sua vida.
O arrependimento está intimamente
relacionado à dependência de Deus. O ato de arrepender-se não produz
transformação definitiva no ser humano; antes, é um espaço concedido a Deus
para que Ele venha moldá-lo conforme a sua vontade. O que garante a
durabilidade dos efeitos dessa transformação não é apenas a atitude humana de
arrependimento, mas também a constante e permanente presença de Deus no homem,
ou seja, o que garante a durabilidade dos efeitos dessa transformação é a
consciência que o homem tem de sua total dependência de Deus.
A atitude de abandono do pecado subentende a volta ou o retorno
do homem para Deus, e essa atitude de voltar-se para Deus deve ser uma
ação contínua da parte do homem para, assim, garantir os efeitos benéficos que
foram produzidos por Deus a partir de sua atitude de arrependimento. Nesse
processo de arrependimento e perdão, a relação entre Deus e o homem será continuamente
uma relação onde o Senhor demonstrará seu cuidado e seu amor na medida em que o
homem reconhece seu estado de pecaminosidade, sua dependência para com Deus e a
superioridade de Deus em relação a ele.
Somente o Espírito Santo pode conhecer
e esquadrinhar o coração humano com profundidade, e aqueles que se abrem ao seu
mover perceberão as situações que precisam
de confissão em seus corações.
O Espírito Santo opera o arrependimento na conversão
(Jo 16.8), assim como se torna a condição necessária para receber o batismo no
Espírito Santo. O batismo é recebido num coração inteiramente voltado para Deus
e purificado do pecado através do arrependimento.
A
purificação do pecado, que é produzida pelo genuíno arrependimento, não deixa o
homem isento de errar novamente, mas livra-o do poder dominador que o pecado
tinha sobre ele. Daí em diante, já livre da escravidão que o poder do pecado
impunha sobre ele, a transgressão, que antes provocava um sentimento de prazer,
provoca agora dor e abatimento da consciência, e a situação agrava-se se não
houver arrependimento. A falta de arrependimento provoca tanto ou mais
sofrimento do que o próprio ato de pecar, visto que, no ato de arrepender-se,
está o caminho para a cura do mal que lhe causa o pecado.
Aceitar
ou não essa salvação é a opção que é dada por Deus ao ser humano mediante a
dádiva do livre-arbítrio. A partir dele, o homem é livre para escolher entre
querer ou não querer o sacrifício feito por Cristo em favor dele e de toda a
humanidade. Existem apenas dois caminhos e, ao optar conscientemente pela
negação a Deus, o homem coloca-se num caminho de condenação eterna, mesmo que
ele não admita isso.
Quando
o homem nega conscientemente a Deus, ele segue gradativamente rumo à destruição
de sua própria vida. A condenação final virá no dia do grande encontro entre
Deus e o homem, onde todos seremos julgados e, a partir desse julgamento,
absolvidos ou condenados. No entanto, as consequências dessa escolha podem ser
vistas cotidianamente na vida de tais pessoas, visto que abandonar a Deus leva
o homem à indiferença para com Ele, que, por fim, leva à oposição obstinada
contra Ele. Nessa fase, o ser humano aprofunda-se no pior dos pecados, que é a
blasfêmia contra o Espírito Santo.
A blasfêmia contra o Espírito
Santo acontece quando
o homem opõe-se obstinadamente e sem
arrependimento contra Deus. O blasfemo não se ocupa com a preocupação em ter
blasfemado contra Deus. Esse tipo de preocupação é indício sólido de que o
homem ainda não chegou nesse estágio. A característica principal do blasfemo é
que nele não há remorso ou dor pelo seu estado pecaminoso, não havendo, em nenhuma hipótese,
lugar para o arrependimento. Não que o pecado da
blasfêmia não tenha perdão, pois, se houvesse um pecado que Deus não pudesse
perdoar, Ele deixaria de ser Deus. A questão não é que Deus não perdoa esse
pecado; o grande problema é que o blasfemo não consegue mais arrepender-se. Foi
o que aconteceu com Lúcifer, e, não havendo arrependimento, não há espaço para
a graça e nem para a fé, pela qual alcançamos a salvação em Cristo.
É extremamente necessário termos cuidado
com a manutenção de nossa vida com Deus. As ações costumeiras
de falta contra Deus e a ausência de reconhecimento da necessidade de
arrepender-se e novamente ser alvo do perdão de Deus pode levar-nos
gradativamente a um caminho de rebeldia obstinada, e esse é um caminho de
grande perigo. Nele, a pessoa perde a noção da necessidade de salvação, ou
então vai para o outro extremo, onde passa a acreditar que pode obter salvação
mediante seus próprios méritos.
Existe apenas uma porta que nos leva à
salvação, e a chave que abre essa porta não está em nossas mãos, nem tampouco
naquilo que ingenuamente consideramos poder fazer para alcançar essa dádiva. A
chave que abre a porta da salvação está em Jesus. Ele é a chave e também a
porta, e a única coisa que cabe a nós é aceitarmos pela fé, que Ele mesmo nos
deu, que Ele é o único Salvador e que dependemos dEle para alcançar essa
salvação.
A partir de então, tudo se torna novo;
surge, assim, o novo homem nascido de novo (Jo 3.3). Isso significa que a
organização da vida e todos os seus desdobramentos diante da família,
sociedade, política, economia, igreja, amigos — tudo — assume uma nova
característica agora condizente com a ética do evangelho de Cristo (Mt 5-7).
Extraído do livro: A obra da Salvação.
Por: Claiton Ivan Pommerening.
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