Adoração,
Santidade e Serviço. “ Os Princípios de Deus Para Sua Igreja Em Levítico”.
Autor:
Claudionor de Andrade.
Só
viremos a entender plenamente a obra da salvação, em Jesus Cristo, se nos
voltarmos com devoção e temor à teologia do holocausto, o principal sacrifício
levítico. Quando o ofertante apresentava essa oferta ao Senhor, encenava ele,
de maneira vívida e dramática, a História Sagrada. Uma interface perfeita com
João 3.16; sublime teologia. Quem melhor compreendeu a sua doutrina foi o autor
da Epístola aos Hebreus. Inspirado pelo Espírito Santo, ele divisou, nos
animais oferecidos periodicamente a Jeová, o Cordeiro de Deus que tira o pecado
do mundo.
Estudaremos, neste capítulo, a
instituição do holocausto: história, teologia, referência simbólica e
cumprimento em Jesus. Sem o sacrifício dos sacrifícios, não podemos entender o
plano da nossa salvação. O presente estudo, por conseguinte, além de
formalmente tipológico, é essencialmente soteriológico; requer uma exegese
correta que harmonize profetas e apóstolos, pois estes jamais estiveram em
desarmonia.
Que Deus nos permita a perceber a
maravilhosa doutrina da salvação e a desenvolvê-la em nossa jornada
terrena.
I.
HOLOCAUSTO, O SACRIFÍCIO POR EXCELÊNCIA
Como já vimos, a religião noética
gerou grandes santos e teólogos como Jó, Melquisedeque e Abraão. E, pelo que
nos é permitido inferir do texto sagrado, cada um deles, em seu próprio turno,
serviu a Deus com sacrifícios cruentos. Nesse sentido, o rei de Salém, por ter
uma teologia bem mais messiânica e soteriológica, foi além das oferendas
animais. Ao receber o pai dos hebreus, em seu domicílio, Melquisedeque
apresentou-lhe uma oferta que, em virtude de sua essência, unia o Antigo ao
Novo Testamento. Neste tópico, mostraremos por que o holocausto é o ofertório
por excelência.
1.
Definição de holocausto. O termo holocausto provém do vocábulo hebraico
`olah, que significa ascender ou ir para cima. É uma referência tanto à fumaça
da oferta queimada, em si, como à devoção e a entrega amorosa dessa mesma
oferta ao subir à presença de Deus (Lv 1.9). Sacrifício dos sacrifícios. Foi
por essa razão, que Paulo considerou o desprendimento dos irmãos filipenses, em
favor da obra missionária, como um holocausto de cheiro suave ao Senhor (Fp
4.18).
O holocausto era o mais importante
sacrifício do culto hebreu (Lv 1.1-3). Consistindo no oferecimento de aves e
animais limpos, requeria a queima total da vítima; era pleno e incondicional
(Lv 1.9). Tendo em vista a sua relevância, inaugurava todas as solenidades
diárias, sabáticas, mensais e anuais do calendário litúrgico do Antigo
Testamento.
O
holocausto era conhecido também como oferta queimada.
Ao oferecê-lo ao Senhor, o crente
hebreu fazia-lhe uma oração que, apesar da ausência de palavras, era eloquente
e persuasiva; implicava em sua total submissão ao querer divino. Assim como a
vítima do sacrifício dera-se ao altar sem resistência, assim também o fazia o
adorador naquela instância; entregava-se resignadamente a Deus. Tal atitude
remetia-o ao Calvário.
Jesus Cristo é o holocausto
perfeito.
Quando nos conformamos plenamente à
vontade do Filho, oferecemos ao Pai o mais sublime dos holocaustos;
mostramos-lhe que, pela ação intercessora do Espírito Santo, já estamos
crucificados com Cristo. A partir de agora, não sou eu quem vive, mas Jesus
Cristo vive em mim.
2. A antiguidade do holocausto. O
holocausto é também o mais antigo sacrifício da História Sagrada. Introduzido
mui provavelmente por Abel, foi observado durante todo o período do Antigo
Testamento. É o cerimonial que mais caracteriza o culto levítico; descreve,
gestualmente, a peregrinação da alma penitente da Queda, no jardim do Éden, à
Redenção, no monte Calvário.
Pelo que depreendemos da narrativa
sagrada, após a morte de Jó, o holocausto, como o praticara os primeiros
descendentes de Noé, não demoraria a desaparecer. Manter-se-ia, porém, no clã
de Abraão, o ramo mais nobre de Sem; messiânico e soteriológico.
Em Canaã, se o holocausto noético foi alguma
vez oferecido, não tardou a dar espaço a celebrações sórdidas, lascivas e
criminosas. Naqueles templos e lugares altos, dominados por régulos tiranos e
sanguinários, prostituição e homicídio litúrgico eram livremente praticados. Já
no Egito, sacrifícios como o holocausto eram algo impensável. Se bovinos e
ovinos eram deuses, por que lhes tirar a vida?
Nas escavações arqueológicas
realizadas nos entornos das pirâmides, animais mumificados são descobertos em
nichos e santuários. Aqui, um macaco; ali, um falcão. E quanto ao boi? Era
intocável; personificava a Terra. Imolá-lo? Sacrilégio dos sacrilégios aos
olhos egípcios.
No Cairo, capital do Egito, existe
um museu em que é possível constatar que os ídolos, nos quais Faraó depositava
toda a sua confiança, eram absurdamente esdrúxulos. Cada um deles, embora
tivesse corpo de homem, carregava uma cabeça de animal. Até deus com cara de
cachorro pode ser visto ali entre múmias de reis e carcaças de nobres.
Já que a religião egípcia tinha o
holocausto como algo abominável, como descrever-lhe a soteriologia? Para mim,
semelhante religião nem soteriologia possui. O mais acertado seria qualificá-la
de tanatologia: doutrina ou estudo da morte. Isso porque, no Egito, empregavam-se
todos os recursos para dar a Faraó, após o seu falecimento, confortos, regalias
e honras. O reino do Nilo mais parecia uma imensa casa funerária.
A bem da verdade, os egípcios não
acreditavam na vida eterna, mas numa morte sem fim. No mundo além, dependiam do
mundo aquém. Nem mesmo Aquenáton que, reinando no século XIV antes de Cristo,
buscou estabelecer um culto monoteístico em ambos os Egitos (alto e baixo),
logrou uma doutrina da salvação que tivesse a Deus como redentor. Adorando o
Sol, ignorou o Criador dos Céus e da Terra.
Retornemos, agora, aos descendentes
de Noé que perseveraram em seguir-lhe as pisadas.
3.
O holocausto no período patriarcal. Se considerarmos o sacrifício que Abel
ofereceu ao Senhor uma espécie de holocausto, então essa oferenda foi, de fato,
a mais antiga da História Sagrada (Gn 4.4). O costume seria preservados pelos
filhos de Abraão em Isaque e Jacó (Gn 8.20; 22.13).
A religião divina, como Adão e Noé a
transmitiram a seus descendentes, foi preservada nos holocaustos que, sem
interrupção, foram oferecidos ao Senhor desde Abel até a destruição do Templo
de Esdras, no ano 70 de nossa era. Cada vez que um desses crentes imolava um
animal, profetizava ele, tipologicamente, a morte de Cristo no Calvário. Em
cada oferenda, sustentada pela fé, havia uma súmula da soteriologia que hoje
professamos.
4. O holocausto no período mosaico.
Após a saída dos filhos de Israel do Egito, o Senhor instruiu Moisés a
sistematizar o culto divino, para evitar impurezas pagãs. Quanto ao holocausto,
por exemplo, apesar de já ser uma tradição na comunidade de Israel, teria de
observar preceitos e normas. A partir daquele momento, haveria um altar
específico para as ofertas queimadas (Êx 31.9). Tudo deveria ser executado de
acordo com as normas estabelecidas por Deus (Lv. 1—6).
Em sua peregrinação, os israelitas
retornam livremente ao holocausto. Se, no Egito, era abominação imolar um
animal a Jeová, agora, naquele deserto inóspito, o sacrifício de animais veio a
constituir-se na parte mais bela e nobre da religião hebreia. Os sacerdotes,
agora, ofereciam redis inteiros ao Senhor.
Como
puderam eles criar tantos animais, não apenas consumo próprio, como também para
oferecê-los a Deus? Se em prados verdejantes e junto a águas tranquilas já é
difícil tanger bois e carneiros, o que fazer em regiões ermas e abrasadoras?
Quando nos pomos a servir a Deus, tudo Ele dispõe a nosso favor. À noite, orvalhava
o maná para o sustento do povo. Durante o dia, providenciava o pasto àqueles
rebanhos que se esparramavam pelo Sinai.
A instituição e a continuidade do
culto levítico, no deserto, constitui, em si, um grande milagre. Uma religião
como a hebreia que, litúrgica e teologicamente, requer animais, perfumes,
incensos e pães, não pode sobreviver sem uma logística perfeita. Num grande
centro urbano, não haveria problemas; fornecedores de matérias-primas não
faltam. Mas, no Sinai, já distante do Egito e ainda longe de Canaã, adorar ao
Senhor, com os rigores e demandas do culto levítico, era um desafio cotidiano.
Sem mencionar a construção do Tabernáculo em si.
5. O holocausto na Terra de Israel. Após a
conquista de Canaã, os holocaustos continuaram a ser oferecidos livremente ao
Deus de Abraão. Josué celebrou uma importante vitória sobre os cananeus com
holocaustos e ofertas pacíficas (Js 8.31). Gideão, ao ser comissionado pelo
Senhor para libertar Israel, ofertou-lhe um holocausto (Jz 6.26). Quanto a Samuel,
ofereceu o mesmo sacrifício ao Poderoso de Jacó, antecipando uma grande vitória
sobre os filisteus (1 Sm 13.9,10). A reforma de Ezequias foi marcada por
generosos holocaustos (2 Cr 29.7-35). Após o retorno do exílio, os judeus,
agradecidos a Deus pela restauração de seu culto, também ofereceram-lhe
holocaustos que iam além de suas posses (Ed 8.35).
A essa altura, o que era tradição
adâmica e noética torna-se instituição religiosa em Israel. Agora, o holocausto
é visto como a principal liturgia do culto israelita. Se fizermos uma pesquisa
no âmbito da história, da cultura e da antropologia, concluiremos que apenas a
linhagem de Sem observou a prática de ofertas queimadas ao Senhor. Quanto aos
camitas, que povoaram a África e partes do Oriente Médio, e aos jafetitas, que
colonizaram a imensa região da Eurásia, temos evidências de que não deram
continuidade a oferenda com que Noé inaugurara a segunda civilização humana.
As etnias acima citadas praticavam
sacrifícios cruentos; nenhum desses, porém, assemelhava-se ao holocausto
semítico. Entre os povos tidos como bárbaros, houve (e ainda há) abate ritual
de animais e de seres humanos. Mas holocausto, semelhante ao hebreu e com a sua
essência teológica, não; é algo exclusivo de Israel, a linhagem mais nobre e
representativa de Sem. E, por se falar em sacrifícios humanos, veremos, daqui a
pouco, por que esse tipo de oferenda jamais seria aceito por Deus.
II. A IMPLICAÇÃO
TEOLÓGICA DO HOLOCAUSTO
Em todo sacrifício levítico,
subjaz uma teologia que tem, em sua natureza, uma soteriologia que nos remete,
de imediato, à morte vicária de Jesus Cristo. Sendo assim, precisamos descobrir
aquilo que não seria incorreto chamar de a mecânica teológica do holocausto.
1. A consciência do pecado
humano. Quando um crente hebreu
propunha-se a oferecer um holocausto ao Senhor, a primeira coisa que lhe vinha
ao coração era a sua própria culpabilidade (Sl 51.5). Ele sabia que, em Adão,
todos haviam pecado; ninguém seria tido por inocente diante de Deus. Até mesmo
o recém-nascido, apesar de ainda não ter a experiência do pecado, já carregava,
em si, a essência da ofensa adâmica (Rm 3.23; 5.12).
Se a situação do
peregrino é tão desfavorável, o que fazer?
Ele não poderia apresentar a si
próprio a Deus, pois não ignorava a pecaminosidade que lhe ia na alma. Por
isso, buscava num animal tenro, bom e geneticamente perfeito (símbolo de um
intermediário eficaz); uma ponte que o conduzisse a Deus. Sem o saber, o penitente
evocava perspectivamente, pela fé, ali, junto àquele altar, o sacrifício do
Senhor Jesus Cristo no Calvário. O Filho de Deus haveria de morrer, de fato, em
favor de todos os filhos de Adão: pelos contemporâneos da cruz, pelos que
viriam a nascer e pelos que já haviam morrido.
2.
A consciência da justiça divina. Já diante do altar, esse mesmo crente
sabia que, confrontado pela justiça de Deus, merecia apenas uma coisa: a morte;
o salário mais adequado ao pecado adâmico. Nesse impasse, a pergunta vinha-lhe
à mente: “Como aplacar um Deus irado?”. Se, por um lado, ele sabia que Deus é
justo, por outro, não ignorava que a justiça divina jamais deixava de vir
acompanhada por um amor que, incompreensivelmente, se dá. Por essa razão,
apresentava ao Senhor a vítima do holocausto, como a rogar-lhe: “Nele,
perdoa-me”. E, pela fé, era não apenas perdoado, mas justificado imediatamente.
A justificação não é uma doutrina
exclusivamente apostólica; no âmbito profético, era já conhecida e praticada
junto ao trono divino. O salmista, ao discorrer sobre a ousada ação de Fineias
no episódio de Baal-Pedor, reconhece: “Isso lhe foi imputado por justiça, de
geração em geração, para sempre” (Sl 106.31, ARA).
No episódio narrado pelo autor
sagrado, observa-se que Fineias assim agiu porque fora movido por uma fé
incomum na santidade divina. E, por essa mesma fé, foi justificado. O mesmo
acontecia àquele que, crendo na justiça divina, apresentava-lhe um holocausto.
No ato da matança e da queima do animal, mostrava ele a Deus a sua confiança
num sacrifício vicário que alcançaria o mundo todo.
No ato do holocausto, desfilava
diante de Deus toda a soteriologia do Novo Testamento.
3. A consciência da propiciação
diante de Deus. O que o crente hebreu mais ansiava era tornar-se propício a
Deus. Todavia, ninguém poderia fazê-lo por si só, a não ser por meio de um
intermediário, que fosse visto pelo justíssimo Deus como alguém igualmente
justo, santo, inocente e eficaz como salvador; o próprio Filho de Deus.
Nos tempos dos patriarcas, ainda não
se tinha um retrato do Messias como hoje encontramos nos Salmos e nos Profetas.
Davi, em vários de seus cânticos, descreveu a vida, a morte e a ressurreição de
Jesus Cristo. Já Isaías, no capítulo 53 de seu livro, pinta o Servo de Jeová em
tons fortes e inapagáveis.
Ambos os autores sagrados já não
precisavam do holocausto para saber que o Filho de Deus, ao vir a este mundo
como homem, teria o mesmo destino do animal oferecido a Deus numa oferta
queimada. Eis porque o rei de Israel, numa evocação messiânica, lembra a
transitoriedade do holocausto na soteriologia messiânica: “Sacrifícios e
ofertas não quiseste; abriste os meus ouvidos; holocaustos e ofertas pelo
pecado não requeres” (Sl 40.6, ARA). Davi,
como bom teólogo, sabia que o homem, para tornar-se propício diante de Deus,
carece não propriamente de um animal perfeito, mas de um perfeitíssimo
medianeiro. Já antevendo não apenas o Messias, mas também o Consolador, roga
ele a Jeová, depois de haver quebrantado duplamente a lei divina:
Esconde o rosto dos meus pecados e
apaga todas as minhas iniquidades. Cria em mim, ó Deus, um coração puro e
renova dentro de mim um espírito inabalável. Não me repulses da tua presença,
nem me retires o teu Santo Espírito. Restitui-me a alegria da tua salvação e
sustenta-me com um espírito voluntário. (Sl 51.9-12, ARA)
Observemos que Davi, embora
almejasse a aceitação de Deus, não lhe ofereceu um único holocausto. Sua
compreensão das coisas divinas ia além da pedagogia das oferendas e dos sacrifícios.
Naquele momento, ofertório algum, ainda que duplamente cruento, ser-lhe-ia
útil. Por essa razão, evocando implicitamente a intermediação de Jesus Cristo,
o Holocausto dos holocaustos, confessa sua confiança no verdadeiro Mediador
entre Deus e os homens: “Pois não te comprazes em sacrifícios; do contrário, eu
tos daria; e não te agradas de holocaustos. Sacrifícios agradáveis a Deus são o
espírito quebrantado; coração compungido e contrito, não o desprezarás, ó Deus”
(Sl 51.16,17, ARA).
Não procuramos, aqui, ao evocar Davi
e Isaías, invalidar o holocausto na compreensão da soteriologia bíblica. Sem
esse sacrifício, o profeta e o rei jamais viriam a entender adequadamente a
mecânica da redenção que Deus, em Jesus Cristo, nos providenciara antes mesmo
da fundação do mundo.
4. A consciência de um sacrifício perfeito
diante de Deus. Assombrado pela justiça divina, indaga o profeta:
Com que me apresentarei ao SENHOR e
me inclinarei ante o Deus excelso? Virei perante ele com holocaustos, com
bezerros de um ano? Agradar-se-á o SENHOR de milhares de carneiros, de dez mil
ribeiros de azeite? Darei o meu primogênito pela minha transgressão, o fruto do
meu corpo, pelo pecado da minha alma? Ele te declarou, ó homem, o que é bom e
que é o que o SENHOR pede de ti: que pratiques a justiça, e ames a
misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus. (Mq 6.6-8 ARA)
Sim, indaga Miqueias: “Com que me
apresentarei ao SENHOR?”. Buscando a propiciação divina, o crente hebreu
poderia oferecer diversas coisas a Deus: bezerros, carneiros e azeite. Numa
instância já desesperada, não hesitaria em dar-lhe o próprio filho; o
primogênito da alma. Vejamos a inadequabilidade desses ofertórios. Iniciemos
por examinar a oferta que mais dor custaria a um pai.
Antes de tudo, deixemos bastante
claro, que Deus jamais exigiu sacrifícios humanos. A razão é bastante simples.
Não obstante o custo espiritual, moral e espiritual que tal demanda acarretaria
ao adorador, o seu efeito redentor e soteriológico seria inútil perante a justiça
divina. Se todos pecaram e carecem da glória de Deus, quem estaria apto a
morrer vicariamente por alguém? Um recém-nascido?
Embora ainda inocente, já traz em si
a semente do transgressão adâmica. Até mesmo os três homens mais justos da
História Sagrada não seriam capazes de se darem vicária e salvificamente em
favor dos transgressores, como o próprio Deus o demonstra através do profeta
Ezequiel:
Filho do homem, quando uma terra
pecar contra mim, cometendo graves transgressões, estenderei a mão contra ela,
e tornarei instável o sustento do pão, e enviarei contra ela fome, e eliminarei
dela homens e animais; ainda que estivessem no meio dela estes três homens,
Noé, Daniel e Jó, eles, pela sua justiça, salvariam apenas a sua própria vida,
diz o SENHOR Deus. (Ez 14.13,14, ARA).
No entanto, se o Senhor Jesus Cristo
estivesse nessa mesma cidade, Ele, em virtude de sua justiça vicária,
certamente morreria; ela, porém, seria poupada. Foi o que disse mui sabiamente
o sumo sacerdote Caifás: “Vós nada sabeis, nem considerais que vos convém que
morra um só homem pelo povo e que não venha a perecer toda a nação” (Jo
11.49,50, ARA). Ao registrar o fato, o apóstolo João, com a sua elevadíssima
acuidade teológica, assim interpretou a alocução de Caifás:
Ora, ele não disse isto de si mesmo;
mas, sendo sumo sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus estava para morrer
pela nação e não somente pela nação, mas também para reunir em um só corpo os
filhos de Deus, que andam dispersos. (Jo 11.51,52, ARA).
Inspirados por esse modelo teológico, como
explicaremos a experiência de Abraão ao ser instado pelo Senhor a oferecer-lhe
Isaque? O patriarca, como o melhor teólogo da época, depois de Melquisedeque,
sabia que, seja desta seja daquela forma, haveria de recobrar o filho, pois
tinha irrestrita fé na promessa divina. Mas, ainda que viesse a imolar o seu
querido unigênito, a morte deste poderia ser doxológica, mas jamais
soteriológica e redentora, porque Abraão já havia sido justificado ao crer em
Deus (Gn 15.6). No instante extremo da provação, o Senhor interveio, não
permitindo que o hebreu lhe imolasse o filho da promessa (Gn 22.11-13).
Vicariamente, o ser humano é ineficaz até para si mesmo. Se a nossa morte fosse
suficiente para salvar-nos, bastaríamos optar pelo suicídio, e a nossa
situação, diante de Deus, estaria resolvida de vez. O suicídio, todavia, não
tem qualquer eficácia remidora. Se assim fosse, Judas Iscariotes estaria hoje
no Paraíso junto ao Senhor Jesus. Mas sabemos que, perdendo-se ele, foi para o
seu próprio lugar.
Se a morte do meu primogênito é
ineficaz para tornar-me aceitável diante do Senhor, o que lhe entregarei? Rios
de azeite? O fruto da oliveira pode (e deve) ser apresentado ao Senhor como
dízimo e ação de graças, mas, soteriologicamente, que eficácia tem? Afinal, não
somos salvos pelas obras, mas pela fé em Jesus Cristo. Logo, tais ofertas
servem apenas evidenciar-nos a salvação; somos salvos não pelas boas obras, mas
à prática de obras boas, meritórias e que mostrem, por intermédio delas, o
nosso compromisso com o Pai Celeste.
Restam-nos, agora, os bezerros de um
ano e os carneiros tenros e bons. Tornar-nos-ão propícios a Deus? Como símbolos
e tipos são eficazes. Mas, vicariamente, não. Se a simbologia e tipologia
desses animais fossem recebidas pela fé, o adorador não deixaria de ver, em
cada um deles, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Caso contrário, a
morte desses bichos não passaria de um desperdício litúrgico, um pesado encargo
ao crente, um enfado ao sacerdote e um enojamento ao Senhor.
O adorador que, pela fé, oferecia um
holocausto ao Senhor, demonstrava a eficácia desse sacrifício, em sua vida, na
prática da justiça, no exercício da misericórdia e na vivência do amor divino
em seu cotidiano. E, no final de tudo, veria naquele bezerro ou naquele
carneirinho, o Cordeiro de Deus.
III. JESUS CRISTO, O
HOLOCAUSTO PERFEITO
Para que o Filho de Deus se
tornasse o holocausto perfeito, a fim de redimir a humanidade, três coisas
foram-lhe necessárias: a encarnação, o sofrimento e, finalmente, a morte e a
ressurreição.
1. A encarnação de Cristo.
A encarnação de Cristo foi o cumprimento cabal e perfeito da profecia de Davi:
“Sacrifício e oferta não quiseste; os meus ouvidos abriste; holocausto e
expiação pelo pecado não reclamaste” (Sl 40.6).
O que o Messias, por meio do salmista, diz é
que, sendo os holocaustos transitórios, restava-lhe apresentar-se voluntária e
eternamente, perante o Pai, para ser a oferta e o ofertante, a fim de redimir a
humanidade (Hb 10.1-10). Foi na condição de Homem Verdadeiro que o Senhor Jesus
foi provado em todas as coisas, exceto no pecado, para mostrar a eficácia de
seu maravilhoso e definitivo sacrifício. 2.
O sofrimento de Cristo. Assim como a vítima do holocausto era, antes de ser
queimada, repartida em pedaços, foi o Senhor Jesus submetido a todos os
sofrimentos, angústias e dores (Is 53). Ele sabia o que era padecer.
O autor da Epístola aos Hebreus garante que o
Filho de Deus, durante o seu ministério terreno, apresentou ao Pai constantes
rogos, clamores e lágrimas (Hb 5.7). Da encarnação à morte, Ele foi
implacavelmente provado em todas as coisas. Mas, nem por isso, deixou de
apresentar um fiel testemunho como o Cordeiro de Deus (Jo 1.29).
3. A morte e a ressurreição de
Cristo. O auge do sofrimento do Filho de Deus, como nosso perfeito holocausto,
foi a sua morte no Calvário. Antecedendo o seu sacrifício, rogou ao Pai que lhe
afastasse aquele cálice (Mc 14.36). No entanto, Ele sabia que a morte na cruz
era a sua missão, o ápice de seu ministério. Em sua morte, a nossa vida.
Na verdade, foi morto e sepultado
(Mt 27.59-66). No terceiro dia, entretanto, eis que ressurge dos mortos como
Rei dos reis e Senhor dos senhores (Mt 28.1-10). Com a sua ressurreição, Jesus
Cristo plenifica o sacrifício perfeito, como ofertante e oferta.
CONCLUSÃO
Neste capítulo, refletimos sobre o
sacrifício perfeito de Jesus Cristo. Ele é o Holocausto dos holocaustos. Ele
morreu eficazmente por mim e por você. Por essa razão, mantenhamos uma vida de
santidade e pureza, a fim de sermos fiéis testemunhas do Evangelho. Não
ignoremos o sacrifício de Cristo. Se o fizermos, sobre nós recairá o justo
juízo de Deus (Hb 10.26,27).
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