I.
Os dez preceitos do decálogo são, convenientemente, distribuídos entre os da
primeira e os da segunda tábua. À primeira tábua são atribuídos aqueles
preceitos que prescrevem, diretamente, o nosso dever, para com o próprio Deus;
deste tipo, há quatro. A segunda tábua contém os preceitos que contêm os
deveres dos homens para com os seus companheiros; para isso são atribuídos os
seus últimos.
II. Esta é a relação que subsiste entre os
mandamentos de cada tábua – o fato de que, por amor a Deus e com referência a
Ele, manifestamos amor e as funções do amor para com o nosso próximo; e se
acontecer de necessitarmos abrir mão de nosso dever para com Deus ou para com o
nosso próximo, Deus deve ter a preferência, acima do nosso próximo. Esta
relação, no entanto, deve ser interpretada como sendo a respeito apenas
daqueles preceitos que não são de adoração cerimonial; caso contrário [a
respeito das cerimônias] esta declaração é válida: “Misericórdia quero e não
sacrifício” (Mt 9.13).
III. O primeiro mandamento é: “Não terás outros
deuses diante de mim”.
IV. É certo que, neste preceito negativo, a
afirmativa acrescentada é incluída ou pressuposta, como algo que é
precedente,sendo um requisito: “Eu sou o Senhor, teu Deus... portanto, não
reconhecerás outro deus além de mim”. Isto é imediatamente consequente ao
prefácio: “Eu sou o Senhor, teu Deus”, portanto, “Deixa me ser o Senhor, teu
Deus”, ou, o que é a mesma coisa, “Portanto, tereis a mim, o Senhor, como vosso
Deus”.
V. Todavia, ter o Senhor como nosso Deus é parte,
tanto do entendimento como da inclinação, ou vontade; e, por fim, de um efeito
que procede de ambos, e de cada um deles.
VI. “Outro deus” é tudo aquilo que a mente humana
inventa, a que se atribui a divindade que é apropriada e adequada apenas ao
Deus verdadeiro – quer essa divindade seja essência e vida, ou propriedades,
obras ou glória.
VII. Ou se a coisa a que o homem atribui
divindade seja algo existente ou criado, ou seja algo que não existe e seja
meramente imaginária e uma fábula da mente, é, igualmente, “outro deus”, pois
toda a divindade desse outro deus está radical, essencial e praticamente na
atribuição humana, e de maneira alguma naquilo a que tal divindade é atribuída.
Daí, a origem desta frase, nas Escrituras: “não seguireis após o vosso
coração”.
VIII. Porém, este “outro deus” pode ser concebido
sob uma tripla diferença, segundo as Escrituras. Pois aqueles que o têm, (1.)
foram os que o inventaram, (2.) ou o receberam de seus pais, ou (3.) de outras
nações, quando nem eles nem seus pais o conheciam; e esta última situação
acontece pela força, ou pela persuasão, ou pela livre e espontânea escolha da
vontade.
IX. Por este motivo, esse “outro deus” é, na
verdade, chamado “ídolo”, e o ato pelo qual ele é considerado outro deus é
idolatria, quer seja cometido na mente, por avaliação, conhecimento e crença,
ou pelos sentimentos, amor, temor, confiança e esperança, ou algum efeito
externo da honra, adoração, e invocação.
X. A enormidade deste pecado é aparente pelo fato
de ser chamado “uma deserção de Deus”, “o abandono da fonte viva” e “cisternas
rotas, que não retêm as águas”, “um pérfido abandono do santo matrimônio” e uma
“violação ao pacto matrimonial”. Na verdade, os gentios são descritos como
sacrificando aos demônios o que deveriam oferecer a Deus, nesta ignorância de
Deus e alienação da vida de Deus.
XI. A causa pela qual os homens são ordenados a
servir os demônios, ainda que eles mesmos tenham outras ideias, é esta: porque
Satanás é a fonte principal e origem de toda idolatria; e é o autor, persuasor,
instigador, aprovador e defensor de toda a adoração que é dedicada a outro
deus. Consequentemente, é o maior grau de idolatria, quando alguém considera
divino, ou atribui divindade a Satanás, como Satanás, exibindo-se como Satanás
e louvando a si mesmo, diante de Deus.
XII. Porém, embora os gentios adorassem anjos ou
demônios, não como o Deus supremo, mas como divindades menores e seus
ministros, por cuja intervenção podiam ter uma comunicação com o Deus supremo,
ainda assim, a adoração que lhes prestavam era idolatria, porque esta adoração
não era devida a ninguém, exceto ao Deus verdadeiro. Apesar disso, a definição
de idolatria não diz que uma pessoa deva prestar a outra a adoração que é
devida somente ao Deus verdadeiro; pois será suficiente se o reconhecer como
Deus, atribuindo-lhe a adoração divina, embora, em sua mente, possa não
considerá-lo como o Deus supremo. Isto não é um alívio para o crime, mas um
agravo, se alguém presta, conscientemente, uma adoração divina a alguém que
sabe que não é Deus.
XIII. E Cristo deve ser honrado como o Pai, pois
foi constituído por seu Pai como REI e SENHOR, recebendo todo o juízo e, assim,
todo joelho deve se dobrar diante dEle. Ele deve ser invocado como Mediador e
Cabeça de sua Igreja, de modo que a Igreja possa prestar esta honra
exclusivamente a Ele, sem incorrer no crime de idolatria; portanto, os
papistas, que adoram Maria, ou os anjos, ou os santos, invocando-os como os
doadores e administradores de dons, ou intercessores por seus próprios méritos,
são culpados do crime de idolatria.
XIV. Além disto, quando adoram o pão, na Ceia do
Senhor, e recebem e consideram o papa como aquele personagem de que ele se
vangloria ser, cometem o pecado de idolatria.
Fonte:
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para a língua portuguesa da Casa Publicadora das Assembleias de Deus. Aprovado
pelo Conselho de Doutrina.
Título do original em inglês:The Works of James
Arminius, vol.1
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