RETIRADO DO LIVRO - VALORES CRISTÃOS -
Enfrentando as questões morais do nosso tempo.
Douglas Baptista.
A sexualidade tem sido fortemente
desvirtuada na sociedade pós-moderna. De
outro lado, alguns
cristãos insistem em
tratar o assunto
como tabu.
Embora o tema possa trazer desconforto
para alguns, a sexualidade humana não pode ser subestimada. De acordo com
Sigmund Freud (1856-1939), reconhecido como o pai da psicanálise, “o homem tem
necessidades sexuais e, para explicá-las, a biologia lança mão do chamado
instinto sexual da mesma maneira que,
para explicar a fome, utiliza-se do instinto da nutrição. A esta necessidade
sexual dá-se o nome de libido” (FREUD, 1970, vol. XVI
p. 336, 482). Freud atribuiu à libido uma
natureza exclusivamente sexual e considerou a fase oral como a primeira na
organização da libido da criança. As teorias de Freud contrastaram com o
extremo moralismo da interpretação católica e produziram o extremo da
licenciosidade, antinomianismo — desprezo à Lei de Deus — e a
irresponsabilidade sexual (HENRY, 2007, p. 551). Atualmente, a sexualidade da
criança vem sendo estimulada e incentivada de modo precoce, e isso em
detrimento do desenvolvimento natural e saudável, gerando transtornos comportamentais.
Ressalta-se que, em
virtude do avanço da tecnologia da informação e consequente globalização,
nossas crianças têm acesso indiscriminado a todo tipo de conhecimento. E, por
estarem em fase de desenvolvimento, tornaram- se alvo de quem as quer
perverter. Por meio da inversão dos valores, ideologia de gênero e a erotização
da infância, pretendem desconstruir a família tradicional e promover a luxúria,
promiscuidade e a imoralidade. Portanto, pela sua abrangência e importância,
faz-se necessário refletir sobre a sexualidade, seus conceitos, propósitos e limites éticos estabelecidos nas Escrituras Sagradas.
I. SEXUALIDADE: CONCEITOS E PERSPECTIVAS BÍBLICAS
A sexualidade é uma das dimensões do ser
humano criado à imagem e semelhança de Deus. A questão sexual estava presente
no ato da criação quando Deus nos fez “macho e fêmea” (Gn 1.27). Doravante,
após a queda, tornou-se um intrigante tema de pesquisa das ciências naturais
(biologia, anatomia, etc.) e das ciências humanas (literatura, psicologia,
etc.). O campo de abrangência perpassa pela identificação sexual,
orientação/preferência sexual, erotismo, satisfação e prazer, imoralidade,
prostituição e pornografia, dentre outros. Por meio da revolução sexual das
últimas décadas, que relativizou e desvirtuou a liberdade sexual, surgiram
novas questões nas áreas da ética, da moral e da religiosidade. Por
conseguinte, os conceitos na perspectiva bíblica precisam ser restaurados.
1. Conceito de Sexo e Sexualidade
A biologia define “sexo” como um conjunto
de características orgânicas que diferenciam o macho da fêmea. O sexo de um
organismo é definido pelos gametas que produzem. Gametas são células sexuais
que permitem a reprodução dos seres vivos. O sexo masculino produz gametas
conhecidos como espermatozoides e o sexo feminino produz gametas chamados de
óvulos. A expressão “sexo” ainda pode ser usada como referência aos órgãos
sexuais ou à prática de atividades sexuais. Já o termo “sexualidade” representa
o conjunto de comportamentos, ações e práticas dos seres humanos que estão relacionados com a busca da
satisfação do apetite sexual, seja pela necessidade do prazer, seja da procriação
da espécie.
A deturpação da sexualidade
Dentro dos conceitos
modernos da sexualidade, o filósofo francês Michel Foucault (1926-1984)
discorreu na obra História da Sexualidade que a postura cristã é repressiva e
envolve “proibições, recusas, censuras e negações discursivas” que são impostas
à sociedade (FOUCAULT, 1988, p. 16). Confabula o filósofo que, ao mesmo tempo
em que o radicalismo cristão levava as pessoas a detestar o corpo, também
tornou o sexo cobiçado e mais desejável; por conseguinte, a austeridade cristã
deve ser combatida em busca de “liberação” sexual (FOUCAULT, 1988, p. 149).
Foucault afirma que
essa liberação surgiu quando Freud dissociou a sexualidade do sexo que era
baseado na anatomia e suas funções de reprodução restringida aos aspectos
biológicos (FOUCAULT, 1988, p. 141). Assim, Foucault considera a sexualidade
como uma produção discursiva, e, portanto, um construto sócio-histórico de uma
sociedade. Por isso, o apelo e o discurso ofensivo na construção da ideologia
de gênero, identidade sexual, iniciação sexual precoce, homoafetividade e a
nova moda de se falar em sexualidade no plural, como existindo “sexualidades”.
A partir daí, o conceito foi deturpado e, em busca de “liberação”, ensina-se
que a sexualidade depende da cultura inserida em determinado grupo social.
Desse modo, toda e qualquer escolha ou opção sexual passa a ser válida, tais
como, homossexualismo, zoofilia, pedofilia, necrofilia e incesto.
2. O Sexo Foi Criado por Deus
O homem e a mulher possuem imagem e
semelhança divina. Porém, no ato da
criação, Deus os fez sexualmente diferentes: “macho e fêmea os criou” (Gn
1.27). Portanto, o sexo faz parte da constituição anatômica e fisiológica dos
seres humanos. Homens e mulheres, por exemplo, possuem órgãos sexuais distintos
que os diferenciam sexualmente. Sendo criação divina, o sexo não pode ser
tratado como algo imoral ou indecente. As Escrituras ensinam que, ao término da
criação, “viu Deus tudo quanto tinha feito, e
eis que era muito bom” (Gn 1.31). Desse modo,
o sexo não deve ser visto como sendo algo pecaminoso, sujo ou proibido. Tudo o
que Deus fez é bom. O pecado não está no sexo, mas na perversão de seu
propósito.
A reprodução sexuada e dioica
Ao criar o ser
humano, Deus os dotou de órgãos específicos e especialmente destinados à
reprodução da espécie, chamados órgãos sexuais ou genitais. A esse processo de
perpetuação da espécie humana dá-se o nome de “reprodução sexuada”. A
reprodução sexuada dos seres humanos é classificada, quanto ao sexo, de
“dioica”, ou seja, requer a participação de dois seres da mesma espécie, sendo
obrigatório que um deles seja “macho” e outro seja “fêmea”. E isso pelo fato
inequívoco de que homem e mulher foram criados com órgãos sexuais apropriados à
reprodução. Trata-se de um processo em que há a troca de gametas (masculinos e
femininos) para a geração de um ou mais indivíduos da mesma espécie.
Percebe-se, então, que Deus não criou meio termo; definitivamente, o ser humano
é formado de macho e fêmea. Deus não formou o homem com possibilidades sexuais
de desempenhar o papel da mulher no ato sexual, e nem vice-versa. O nosso Jesus
Cristo, ao discorrer sobre esse tema, associou a anatomia dos sexos com o propósito divino da sexualidade e da
reprodução. O Mestre fundiu o texto da criação e da procriação (Gn 1.27,28) ao
texto do relacionamento conjugal (Gn 2.24) indicando que os textos bíblicos se
complementam, isto é, a reprodução humana é sexuada e dioica:
Porém, desde o princípio da criação, Deus
os fez macho e fêmea. Por isso, deixará o homem a seu pai e a sua mãe e
unir-se-á a sua mulher. E serão os dois uma só carne e, assim, já não serão
dois, mas uma só carne. (Mc 10.6- 8)
3. A Sexualidade É Criação Divina
Ao criar o homem e a mulher, Deus também
criou a sexualidade: “E Deus os abençoou e Deus lhes disse: Frutificai, e
multiplicai-vos, e enchei a terra [...]” (Gn 1.28). O relacionamento sexual foi
uma dádiva divina concedida ao primeiro casal e também às gerações futuras (Gn
2.24). Sempre fez parte da criação original de Deus o homem unir-se sexualmente
em uma só carne com sua mulher. O livro poético de Cantares exalta a
sexualidade e o amor entre o marido e sua esposa (Ct 4.10-12). Portanto, não é
correto “demonizar” o desejo e a satisfação sexual. Assim como o sexo, a
sexualidade também não é má e nem pecaminosa. O pecado está na depravação
sexual que contraria os princípios estabelecidos nas Escrituras Sagradas.
A sexualidade no livro de Cantares
No judaísmo, a
interpretação alegórica de Cantares faz alusão ao amor entre Deus e Israel, e
na tradição cristã aparece como uma metáfora do amor existente entre Cristo e sua
Igreja. Porém, quanto ao seu gênero literário, Cantares de Salomão é
reconhecido pelos intérpretes como sendo um poema de amor. A linguagem é
franca, mas também é pura. O livro louva o relacionamento conjugal regido pelo
mútuo amor entre marido e mulher. Cantares exalta a sexualidade e não despreza
o prazer sexual no âmbito do matrimônio. O livro narra a celebração do amor na
noite de núpcias (Ct 4.1-
16) e na vida matrimonial do casal
eternamente enamorado (Ct 5.2-6). Nota- se que o livro desmistifica a
sexualidade e condena a licenciosidade, enaltece a paixão e desqualifica a
promiscuidade, exalta o amor e despreza a lascívia. Assim, Cantares apresenta a
sexualidade humana sem depravação e sem malícia. A mensagem denota o ideal
divino para a sexualidade: bela, santa e pura.
II. O PROPÓSITO DO SEXO SEGUNDO AS ESCRITURAS
O sexo como criação divina possui
finalidades específicas. Holmes afirma que a “história da ética cristã é
bastante clara nesse particular. A psicologia do sexo indica o seu potencial de
união, e sua biologia indica um potencial reprodutivo” (HOLMES, 2013, p. 130).
Portanto, o relacionamento sexual conforme idealizado pelo Criador prevê uma
realização completa entre macho e fêmea na busca do prazer conjugal e na
procriação da espécie.
1. Multiplicação da Espécie Humana
A finalidade primordial do ato sexual
refere-se à procriação. Deus abençoou o
primeiro casal e lhes disse: “Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra”
(Gn 1.28). Tal como o Criador ordenara a procriação dos animais (Gn 1.22),
também ordenou a reprodução do gênero humano. Nesse ato, Deus concedeu ao homem
poderes para se multiplicar assegurando-lhe a dádiva da fertilidade. Depois da
queda no Éden (Gn 3.11,23) e a consequente corrupção (Gn 6.12,13), Deus enviou
o dilúvio como juízo para eliminar o gênero humano (Gn 6.17), exceto Noé e sua
família (Gn 7.1). Passado o dilúvio, Noé recebeu a mesma ordem recebida por
Adão: “E abençoou Deus a Noé e a seus
filhos e disse-lhes: Frutificai, e multiplicai-vos, e enchei a terra” (Gn 9.1).
A terra despovoada deveria ser repovoada para dar continuidade aos desígnios
divinos (Gn 3.15; Rm 16.20).
A bênção da fertilidade
Como já visto, a
ordem divina para a procriação da espécie humana é precedida pela bênção da
fertilidade (Gn 1.28). A partir dessa dádiva e ordenança divina, as narrativas
bíblicas registram a busca pela maternidade e paternidade como anseio geral
tanto de mulheres quanto de homens. A fertilidade passa a ser indispensável
para o cumprimento do preceito divino. Desse modo, os registros das Escrituras
quanto à sexualidade estão intrinsecamente relacionados com a reprodução e
procriação da vida humana. Após a queda do homem no Jardim do Éden, Deus avisa
que, por causa da desobediência, a bênção da fertilidade
trará também sofrimento: “E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a tua dor
e a tua conceição; com dor terás filhos” (Gn 3.16). Apesar desse novo
ingrediente, mulheres e homens, por meio da união heterossexual e do casamento
monogâmico, anseiam cumprir a multiplicação da espécie e prover descendência
para a família.
2. Satisfação e Prazer Conjugal
Por muito tempo, o catolicismo ensinou que
a procriação era o único propósito da relação sexual. O Concílio de Trento
(1545-1563) disciplinou a prática sexual com fins exclusivos de reprodução e
proibiu o sexo aos domingos, nos dias santos e no jejum quaresmal. Não
obstante, a Bíblia também se refere ao sexo como algo prazeroso e satisfatório
entre um marido e sua esposa: “Seja bendito o teu manancial, e alegra-te com a
mulher da tua mocidade [...]” (Pv 5.18,19), e ainda “Goza a vida com a mulher
que amas, todos os dias de vida [...]” (Ec 9.9). Assim, na união conjugal, o
homem e sua mulher devem buscar satisfação sexual (1 Co 7.5).
O prazer e o deleite
sexual não devem servir para a satisfação promíscua e egoísta de um dos
cônjuges. A satisfação conjugal deve ser precedida do sentimento mútuo de amor
entre macho e fêmea (1 Co 7.3-5). Apesar das afirmações equivocadas da
atualidade que associam amor, sexualidade e casamento como sendo uma invenção
da era burguesa do século XVI, a Bíblia Sagrada ensina desde os primórdios o
mútuo cuidado, carinho e o respeito entre um homem e uma mulher casados (Ef
5.21-28). Desse modo, a completa satisfação sexual envolve emoções,
sentimentos, carícias e prazer para ambos os cônjuges. De acordo com as
Escrituras, o romance e o dom da sexualidade devem ser usados para o prazer
mútuo dentro do contexto do casamento monogâmico e heterossexual.
3. O Correto Uso do Corpo
No ato sexual ocorre a fusão de corpos (Mt
19.6). O sexo estabelece um vínculo tão forte entre os corpos que os torna uma
só pessoa. Como os nossos corpos são membros de Cristo (1 Co 6.15) e templo do
Espírito Santo (1 Co 3.16), as Escrituras proíbem o uso do corpo para práticas
sexuais ilícitas (1 Co 6.16). São condenadas, dentre outras, as relações
incestuosas (Lv 18.6- 18), o coito com animal (Lv 18.23), o adultério (Êx
20.14) e a homossexualidade (Rm 1.26,27). O corpo não pode servir à
promiscuidade (1 Co 6.13). Assim, o nosso corpo deve servir para glorificar, e
não para afrontar a Deus (1 Co 6.20).
Templo do Espírito Santo
Escrevendo à Igreja
em Corinto, Paulo menciona vários tipos de pessoas que pecam contra o corpo e
são sexualmente imorais, tais como, “os devassos”, “os adúlteros”, “os
efeminados” e “os sodomitas”, os quais,
afirma o apóstolo, não herdarão o reino de Deus (1 Co 6.10). Em seguida,
o texto paulino questiona a igreja acerca do uso indevido do corpo: “Não sabeis
vós que os vossos corpos são membros de Cristo?” (1 Co 6.15). Por conseguinte,
Paulo ensina que o corpo não pertence ao crente, e sim a Deus; por isso, o
corpo não pode ser objeto da imoralidade sexual (1 Co 6.18). O ensino assevera
que a imoralidade sexual é pecado que afronta ao próprio corpo, que é templo do
Espírito Santo (1 Co 6.19). Por essa razão, o crente não deve contaminar o
corpo, pois é santuário de Deus. Por fim, exorta-nos o texto bíblico: “[...]
glorificai, pois, a Deus no vosso corpo e no vosso espírito, os quais pertencem
a Deus” (1 Co 6.20). Conclui a Escritura que o nosso corpo foi comprado por bom
preço, e, por essa razão, pertence ao Senhor que nele habita e requer do crente
salvo que mantenha o templo do Espírito Santo em pureza sexual.
III. O CASAMENTO COMO LIMITE ÉTICO PARA O SEXO
No casamento, os impulsos sexuais podem
ser satisfeitos sem que se incorra em atos pecaminosos. No entanto, o casamento
não é autorização para a prática de atos pervertidos, devassidão ou escravidão
sexual de um cônjuge sobre o outro. Ainda que o casamento seja um inibidor de
práticas moralmente ilícitas, percebe-se na cultura pós-moderna o
enfraquecimento de sua eficácia no combate à imoralidade. A antiga lei moral
exigia a abstinência extraconjugal por temor de uma gravidez indesejada,
doenças sexualmente transmissíveis ou medo de ser descoberto e ter a reputação
manchada. Atualmente, esses antigos fatores de inibição das relações
extraconjugais sofreram mutações: “a pílula reduziu grandemente o primeiro
temor, as drogas modernas o segundo e as mudanças sociais o terceiro” (HOLMES,
2013, p. 128). Contudo, para o cristão, o propósito divino para o casamento não
pode ser alterado e seus princípios devem ser observados por todos e em todos
os lugares.
1. Prevenção contra a Fornicação
A fornicação está relacionada ao contato
sexual entre pessoas solteiras. Para prevenir esse pecado, o apóstolo Paulo
orienta os cristãos a se casarem (1 Co 7.2, ACF). Os ensinos de Paulo ratificam
o propósito divino do casamento: “uma mulher para cada homem” (Gn 2.24). Esse
princípio também foi defendido por Jesus: “deixará o homem pai e mãe e se unirá
à sua mulher” (Mt 19.5). Desse modo, a legitimidade cristã para a satisfação
dos apetites sexuais entre um homem e uma mulher restringe-se ao casamento monogâmico
(1 Co 7.9). Toda prática sexual realizada fora desses moldes constitui-se em
sexo ilícito.
O sexo pré-matrimonial
Nos textos
vetero-testamentários, a fornicação ou o sexo pré-matrimonial eram punidos
severamente. Se um marido descobrisse após o casamento que sua esposa não era
virgem, o caso seria levado aos anciãos da cidade, que conduziriam a mulher até a porta da casa
de seu pai e os homens a apedrejariam até a morte (Dt 22.20,21).
Na lei mosaica,
também estavam previstas outras punições para os casos de sexo pré-matrimonial
(Êx 22.16,17; Dt 22.23,24). Se a moça fosse violentada e não pudesse fazer nada
para evitar o ato sexual ilícito, ela seria inocentada e o seu agressor seria
apedrejado (Dt 22.25-27). O Novo Testamento mantém a fornicação e o sexo
pré-matrimonial como pecado (1 Ts 4.3). No entanto, a pena de morte física não
é aplicada; a punição é na esfera espiritual que implica morte eterna (Tg
1.15).
O problema da incontinência sexual
Ao tratar das
questões de imoralidade sexual e o comportamento cristão no casamento, o
apóstolo Paulo fazia frente a dois movimentos presentes na igreja de Corinto. O
primeiro era formado pelos libertinos ou antinomianos e o segundo era
partidário do asceticismo. Os libertinos ensinavam que não existe problema
algum com o uso do corpo, isto é, o que alguém faz com o corpo é moralmente
indiferente. Os adeptos do ascetismo de modo geral consideravam que o corpo é
inerentemente mau e que cada um deve afligir e castigar seu próprio corpo
negando-lhe qualquer prazer físico.
Logo depois de
escrever condenando a fornicação, Paulo também ensina à igreja que, após
casados, o marido e a mulher não podem negar o prazer sexual ao seu cônjuge,
pois ambos têm o dever mútuo de satisfazerem-se e manterem a fidelidade
matrimonial (1 Co 7.3). Por essa razão, as Escrituras explicam que o corpo do
homem está sob o domínio da sua esposa e o que o corpo da mulher está sob o
domínio do marido (1 Co 7.4). Isso significa
que o corpo do marido só pode buscar prazer e
satisfação sexual no corpo de sua esposa, e vice-versa. Desse modo, ratifica-se
a união monogâmica e heterossexual e reafirma-se a condenação das demais
práticas como imoralidade sexual.
Em
seguida, o texto bíblico alerta que a privação ou abstinência sexual
dentro do casamento pode ser usada pelo
Adversário como meio de tentação para as práticas sexuais ilícitas (1 Co 7.5).
Por isso, o texto orienta os casais a não privarem um ao outro do ato sexual,
exceto de comum acordo e temporariamente para algum propósito espiritual. O
casal não deve ser ingênuo a ponto de imaginar que não serão tentados ou
traídos por seus impulsos sexuais. Deus instituiu o casamento tanto para a
procriação quanto para evitar o pecado da imoralidade por meio do prazer mútuo
entre marido e mulher.
2. O Casamento e o Leito sem Mácula
As Escrituras ensinam que o casamento é
digno de honra (Hb 13.4) e que a união conjugal deve ser respeitada por todos
(Mt 19.6). O leito conjugal não pode ser maculado por ninguém. Quem o desonrar
não escapará do juízo divino (Hb 13.4b). Aqui a desonra refere-se ao uso do
corpo para práticas sexuais ilícitas com ênfase nos casos de relações
extraconjugais (1 Co 6.10). Inclui também as relações conjugais resultante de
divórcios e de segundo casamentos antibíblicos (Mt 19.9). Embora, muitas vezes,
os imorais escapem da reprovação humana,
não poderão fugir da ira divina (Na 1.3). A práxis da sociedade e a
condescendência de muitas igrejas não invalida a Palavra de Deus.
O modelo bíblico de casamento
Pallister define o
casamento como “ato público em que a pessoa deixa a primeira família em que
cresceu para se unir, pelo resto de sua vida, com uma pessoa do sexo oposto com
a finalidade de constituir uma nova família” (PALLISTER, 2005, p. 168). Esta conceituação
constitui um ato de obediência ao ensino bíblico: “Por essa razão, o homem
deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e eles se tornarão uma só carne” (Gn
2.24, NVI). Nos registros bíblicos, é possível identificar que, ao menos em
alguns casamentos, a união conjugal era precedida pelo sentimento de amor. Jacó
amava tanto a Raquel que nem viu o tempo passar enquanto
trabalhou durante sete anos para pagar o
dote dela (Gn 29.18,20). Mical amava tanto a Davi que o ajudou a fugir,
livrando-o da morte certa, e não temeu a ira de seu pai Saul (1 Sm 18.20,28;
19.11-17). Dessa maneira, o modelo bíblico não se restringe à procriação, mas
também inclui o romantismo e o ato sexual como fonte de satisfação e prazer.
O catolicismo
classificou o casamento como sacramento — rito sagrado instituído para dar,
confirmar ou aumentar a graça. Os teólogos da Reforma Protestante entenderam
que o casamento não é um sacramento, e sim uma aliança, isto é, o casamento não
é apenas um ato formal, mas “uma aliança, assumida diante de Deus, de natureza
permanente e fonte de conforto e alegria
ao longo de toda a vida” (PALLISTER, 2005, p. 174). Em consequência, o amor é
um princípio moral do casamento. Porém, o amor não é o único; a justiça é
igualmente princípio relevante para a união matrimonial. A justiça requer
igualdade para todos e se manifesta contra o abuso sexual de qualquer parte. A Declaração
de Fé das Assembleias de Deus, ao tratar dos propósitos do matrimônio, descreve
o seguinte:
O casamento tem por propósitos: a
instituição da família matrimonial; compensação mútua do casal; a procriação; o
auxílio mútuo e continência e satisfação sexual. Entendemos que o homem é unido
sexualmente à sua esposa, como resultado do amor conjugal, não só para
procriar, mas também para uma vivência afetuosa, agradável e prazerosa.
(SOARES, 2017, p. 204)
Diante destas
assertivas, deve-se reconhecer que o casamento monogâmico entre um homem e uma
mulher é o modelo bíblico para escapar da impureza sexual. Também é possível
perceber que Deus, ao criar o ser humano à sua imagem e semelhança, os fez
macho e fêmea (Gn 1.27) demonstrando a
sua conformação heterossexual. E, ainda, que a diferenciação dos sexos
visa à complementaridade mútua na união conjugal.
Leito sem mácula
A expressão “leito
sem mácula” é um eufemismo usado para suavizar os aspectos que envolvem a
intimidade, o erotismo, os desejos e as relações sexuais entre o marido e a
esposa no contexto da união matrimonial. O leito conjugal não pode ser manchado
pela imoralidade sexual. Aqui estão incluídos como transgressão os pecados
sexuais cometidos dentro ou fora do casamento. O sexo e a sexualidade são atos
da criação divina, e não podem ser tratados como algo pecaminoso e nem como mero
elemento de procriação ou fonte de prazer. Cabe ao cristão cumprir o propósito
estabelecido por Deus para a sexualidade (Gn 2.24). Aqueles que contaminam o
casamento ao ultrapassar os limites divinamente instituídos para o ato sexual
devem estar certos de que enfrentarão um severo juízo (Hb 13.4).
Nenhum comentário:
Postar um comentário