Texto:
João 20.19-31
Ao
examinarmos a narrativa da ressurreição, notamos quão
marcantemente as aparições do Senhor atendiam às necessidades
várias pessoas. Maria, com seu coração cheio de lealdade, recebeu
consolação; Pedro, o arrependido, foi perdoado e restaurado; os
dois pensadores no caminho de Emaús receberam a convicção; e os
dez discípulos amedrontados receberam confiança c forças, enquanto
Tomé foi transformado de duvidoso em crente firme. Para todas estas
pessoas, a presença do Cristo vivo mostrou-se suficiente.
I
- Consolados os Discípulos Amedrontados
(Jo
20.19,20)
O
dia da ressurreição linha sido emocionante, com muitos rumores e
crescentes emoções. Ao fim da tarde, reuniram-se os discípulos.
Trancaram tudo, com medo dos judeus, pensando que a qualquer momento
soldados romanos poderiam ser enviados contra eles, para levá-los
presos como cúmplices de Jesus Nazareno. Certamente tais homens
nunca teriam pregado a ressurreição, a não ser que tivessem
absoluta certeza de que Jesus realmente ressuscitara.
Jesus,
de súbito, estava no meio deles, falando: “Paz seja convosco”. O
Senhor já tinha um corpo espiritual, glorificado, c não estava
sujeito a limitações naturais, tais como portas trancadas. As
palavras “paz seja convosco” tinham mais força do que quando
empregadas no cumprimento tradicional, pois realmente aquietaram os
corações perturbados. Os discípulos sentiam medo antes da vinda de
Jesus (cf. Lc 24.37), mas, agora, sua presença anunciava confiança
e vitória. O aspecto de Cristo era o mesmo, c, ao mesmo tempo,
diferente, de tal forma que o imediato reconhecimento da sua pessoa
nem sempre acompanhava a sua manifestação. Era necessário alguma
coisa a mais para completar a identificação: “E, dizendo isto,
mostrou-lhes as mãos e o lado” (e os pés também - Lc 24.40).
Estava completa a identificação. Era real mente o Crucificado, que
voltara à vida. “Dc sorte que os discípulos se alegraram, vendo o
Senhor”. Não pode haver maior alegria do que esta! No começo, a
notícia parecia boa demais para ser verdadeira (Lc 24.41), c talvez
os discípulos se sentissem como os que sonham (ef. SI 126.1). A
alegria da esperança despertada, no entanto, transformou-se cm
alegria da plena convicção.
II
- A Comissão Dada aos Discípulos Jubilosos
(Jo
20.21-23)
uma
vez dissipados os temores e dúvidas dos discípulos, estes estão em
condições de receber instruções. A primeira “paz” foi para
restaurar-lhes a confiança (v. 19); a segunda “paz” 1'oi para o
serviço (v. 21). Os discípulos foram:
/.
Enviados. “Assim como o Pai me enviou, também eu vos envio a vós”.
Foram enviados para cumprir o mesmo propósito, para completar a obra
iniciada e ocupar o mesmo relacionamento que Ele assumira com o Pai.
O livro de Atos registra como Jesus, mediante o Espírito Santo,
continuou a sua obra nas pessoas dos discípulos.
2.
Inspirados. “E, havendo dito isto, assoprou sobre eles e
disse-lhes: Recebei o Espírito Santo.” O sopro divino c um ato
criador (Gn 2.7; cf. 1 Co 15.45). Nessa ocasião, portanto, os
discípulos receberam do Senhor da vida um tipo de vivificação
espiritual. O “Dom da Páscoa” foi um toque da vida celestial do
Cristo ressurreto, c o “Dom de Pentecostes” foi o revestimento de
poder da parte do Senhor ressurreto. Na primeira instância,
receberam a vida espiritual; na segunda, o poder espiritual.
3.
Autorizados. “Àqueles a quem perdoardes os pecados, lhes serão
perdoados; e àqueles a quem os retiverdes lhes são retidos”. Os
apóstolos nunca assumiram a autoridade de perdoar, no lugar de Deus,
os pecados específicos de indivíduos. O próprio Pedro mandou Simão
recorrer a Deus para pedir perdão (At 2.22). Fístas palavras por
certo referem-se a ofensas contra a disciplina da igreja, e não a
pecados íntimos e pessoais contra Deus. Tal conclusão se obtém da
seguinte maneira: João 20.23 e Mateus 18.18 tratam do mesmo assunto,
e Mateus 18.17 indica que a questão em pauta não é a das ofensas
pessoais, que podem ser solucionadas sem recurso ao ministro (Mt
18.15), e sim à recusa do crente cm submeter-se à disciplina da
igreja. Tal crente tem de ser expulso da igreja. Ao arrepender-se, c
recebido de volta à igreja; seus pecados são “perdoados” (cf. 1
Co 5.5 e 2 Co 2.10).
Não
há base para a doutrina da “sucessão apostólica” aqui, nada
que sugira terem passado os apóstolos esta autoridade a bispos que
se seguiam a eles, c que os bispos pudessem passá-la a sacerdotes.
Pelo contrário, entende se que havia outras pessoas presentes quando
esta comissão foi dada (cf. Lc 24.35), e que as palavras supra
examinadas se aplicam à igreja como um todo. O “perdão” dado na
terra só pode referir-se a transgressões contra a jurisdição e o
aspecto administrativo da igreja.
Ill
- A Convicção Dada ao Apóstolo Duvidosos
(Jo
20.24-29)
1.
O desafio do duvidoso. “Ora, Tomé, um dos doze, chamado Dídimo,
não estava com eles quando veio Jesus.” Tomé, ou Dídimo (que
significa “gêmeo”), era de temperamento sombrio e pessimista (Jo
11.8,16; 14.5). Deixou- se abalar com a tragédia do Calvário, e
estava se ressentindo da perda. Por enquanto, sua fé estava em maré
baixa, c sua esperança, morta. Mesmo assim, não abandonara a sua
lealdade nem o convívio com os apóstolos.
Ouvindo
os testemunhos dos demais discípulos, disse enfaticamente: “Se eu
não vir o sinal dos cravos em suas mãos e não meter o dedo no
lugar dos cravos, c não meter a minha mão no seu lado, de maneira
nenhuma o crerei”. Exigiu a evidência mais positiva da visão e do
tato. Queria crer, mas a tragédia do Calvário abalara a sua fé.
Suas palavras indicam o quanto ainda estava a sua memória fixada nos
terríveis acontecimentos da crucificação. Para ele, as chagas do
Senhor ainda estão abertas c sangrando. Sente necessidade de
evidências positivas de feridas tão mortais terem sido saradas pela
Vida. Tomé, por mais que mereça nossa simpatia, não deixa também
de merecer a nossa censura pela teimosa recusa em crer na palavra de
dez testemunhas oculares de indubitável reputação e qualificação.
Que
Jesus considerou sinceras as dúvidas de Tomé se vê na maneira de
encará-las: o Senhor ressurreto aparece novamente, para oferecer as
provas pedidas pelo discípulo que estivera ausente na primeira
ocasião. Quanto aos zombadores, Jesus encarava-os de modo bem
diferente (cf. Mt 16.4). Jesus aqui fala a um discípulo sincero,
cuja fé era fraca, c não a alguém de coração descrente.
2.
A resposta ao duvidoso. Note-se que, em ambas as ocasiões, Jesus
apareceu no primeiro dia da semana, como se o dia em que ressurgiu
dentre os mortos tivesse sido escolhido para ser honrado de modo
especial. A expressão original traduzida como “dia do Senhor’",
em Apocalipse 1.10, foi o nome que os primeiros cristãos deram ao
domingo.
Jesus,
quase repetindo as palavras empregadas por Tomé para definir os
termos do teste físico que pedia, oferece-se à inspeção do
discípulo. Bastou um único vislumbre do amado Mestre para Tomé se
prostrar em terra com a ardente confissão: “Senhor meu, e Deus
meu!” Sua felicidade era por demais grande para que pensasse em
fazer testes científicos! Suas dúvidas evaporaram diante da
revelação da presença de Jesus, como se dissipam as névoas da
madrugada ao raiar o sol.
Note-se
que a confissão de fé feita por Tomé é a mais avançada entre as
de todos os outros apóstolos durante o seu convívio com Jesus. Pela
graça de Deus, aquele que sentira mais dúvidas chega à crença
mais completa e firme.
“Disse-lhe
Jesus: Porque me viste, Tomé, creste; Bem- aventurados os que não
viram e creram.” Jesus não quer com isso louvar a falta de
indagações e exame; isto seria a credulidade, e não a fé.
O
evangelho convida a um exame das suas verdades fundamentais, porque
“isto não se fez cm qualquer canto” ( At 26.26). O que Jesus
louva é a disposição de aceitar a fidedignidade da evidencia dos
discípulos que o conheciam, sem exigirmos a evidência dos nossos
próprios sentidos.
As
palavras de Jesus a Tomé realmente se dirigem às pessoas de todas
as eras, que não tiveram o privilégio de ver a Jesus. Ele quer que
entendamos que nenhum motivo de inveja temos daqueles que tiveram a
oportunidade de vê-lo, c que somente creram depois de terem visto.
Ensinamentos
Práticos
/.
A missão de Cristo e a nossa. “Assim como o Pai me enviou, também
eu vos envio a vós”. A quem foram ditas estas palavras? A homens
que já tinham visto o Senhor, que haviam sentido o toque das suas
mãos e experimentado a paz que excede todo o entendimento. Aquelas
eram as qualificações para serem enviados cm nome de Cristo, e
também são as nossas, embora cm nosso caso o contato com Cristo
seja espiritual.
Algumas
igrejas consideram apenas os sacerdotes, pastores ou anciãos como
representantes oficiais “enviados” por Cristo, conceito que é
estranho ao ensino do Novo Testamento no que diz respeito ao serviço
cristão. É indispensável um ministério de dedicação integral,
mas, afinal, uma das suas funções principais é levar os crentes à
maturidade espiritual, a fim de que possam ser preparados para o
serviço. “Também eu vos envio a vós”, disse Jesus, e suas
palavras referem-se a todos aqueles que tiveram uma visão do Senhor,
se alegraram com a sua presença c receberam a sua bênção nos seus
corações.
Para
que propósito somos enviados ao mundo? Para produzir em nossas vidas
uma cópia fiel da atitude que Cristo revela para com Deus c o mundo.
Certo homem piedoso declarou que era seu desejo supremo viver de tal
modo que a sua própria vida provasse a veracidade do Evangelho.
A
atitude de Cristo demonstrada na vida diária do crente é um
argumento irrefutável cm prol do Cristianismo.
2.
O Cristo vivo e as portas trancadas. Reflitamos primeiro sobre este
falo: foram os amigos de Cristo, e não os seus inimigos, os
primeiros a trancarem as portas para o Ressurreto. Não somente
estavam trancados entre as quatro paredes de um quarto, como também
nas cadeias do medo, da aflição e da decepção. Lemos, no entanto:
“Cerradas as portas... chegou Jesus”.
Repetidas
vezes a Igreja, com zelo falso ou em ignorância do plano do Senhor,
tem trancado as portas para Ele. Mediante avivamentos espirituais,
porém, as portas de preconceitos tem sido arrombadas. “Cerradas as
portas... chegou Jesus”.
Certo
negociante, que durante anos vivera como agnóstico, disse que sentiu
o toque do Senhor exatamente como se alguém lhe tomasse a mão
enquanto andava na rua, para falar intimamente a ele. Daquele momento
em diante, sua vida foi completamente transformada. “Cerradas as
portas... chegou Jesus”.
Muitos
entre nós, cedendo à depressão, excluem o Senhor sem se aperceber;
Ele, porém, chega para nos elevar do nosso abatimento. E podemos
testificar: “Então Jesus veio a mim, mesmo estando as portas
trancadas”.
3.
Poder espiritual para a obra espiritual. Quando Cristo soprou sobre
os discípulos, estava querendo dizer: “Pessoas espiritualmente
mortas não podem trazer a outros a vida espiritual. Assim sendo, eu
vivifico vocês espiritualmente”. Todos os que se dedicam em ganhar
almas para Cristo reconhecem a verdade das palavras do Senhor: “Sem
mim nada podeis fazer”. Ninguém procurou honestamente
transformar-se em tudo aquilo que Cristo quer que ele seja, sem ter
chegado a gemer, quase desesperado: “Quem é suficiente para estas
coisas?” Embora esta atitude faça mal ao orgulho próprio, é
benéfica à nossa alma. É como clamar: “Senhor, o meu cântaro
está vazio; por favor, encha-o para mim.” Sua resposta vem sem
demora: “Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o
reino dos céus... Bem-aventurados os que têm fome e sede de
justiça, porque eles serão fartos” (ML 5.3,6).
Jesus
disse: “Recebei o Espírito Santo”. Como? Segundo as palavras de
Isaías: "Os que esperam no Senhor renovarão as suas forças”.
4.
Proclamando o perdão aos arrependidos. Um dos possíveis sentidos do
versículo 23: c direito c também dever de todo cristão proclamar
ao mundo que Cristo foi manifestado para tirar o pecado, que aquele
que crê será salvo ("os pecados lhes são perdoados”), e que
quem não crer será condenado (são “retidos” os pecados).
Que
pensamento solene - saber que temos autoridade para dizer ao pior dos
pecadores: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”!
5.
O faltoso. “Ora, Tomé, um dos doze, chamado Dídimo, não estava
com eles quando veio Jesus”. Que hora para faltar á reunião!
Decerto Tomé nem imaginava quão maravilhoso haveria de ser o culto!
Talvez pensasse que os demais discípulos falariam sobre o Cristo
morto. Existem hoje, nas igrejas, pessoas para as quais Cristo não é
uma realidade viva, e imaginam, portanto, não haver vida espiritual
na igreja, faltam, não por indiferença, nem por se sentirem
satisfeitas espiritualmente, mas por falta de esperança.
Contrariamente
às expectativas de Tomé, no entanto, os discípulos tiveram uma
reunião maravilhosa, porque Jesus estava ali. Tomé perdeu muita
coisa: uma demonstração da certeza da vida futura, o gozo de grande
enlevo espiritual, a dádiva da paz, a vocação ao ministério da
pregação e o sopro do Espírito Santo. É triste para a igreja
quando os crentes começam a faltar aos cultos.
6.
Crer é ver. A incapacidade de ver pode ser explicada por um dos dois
motivos seguintes: ou nossa visão é boa e o objeto a ser visto é
obscuro; ou é claro o objeto, e inferior a nossa visão Qual foi o
caso de Tomé? A evidência era suficientemente clara porque tinha o
testemunho unânime de dez homens que conhecia há anos, e isto não
somente pelas palavras deles, como também pelos seus rostos
transformados de júbilo espiritual. A dificuldade, portanto, não
eslava na evidência, e sim na atitude dc Tomé. Jesus, portanto,
disse: “Não sejas incrédulo, mas crente”.
As
pessoas talvez digam que não podem crer nisto ou naquilo, e talvez
estejam sendo sinceras. A pergunta mais importante, em tal caso, é:
“Você realmente quer saber se isto é verdade? E estaria disposto
a conformar sua conduta com os fatos, uma vez averiguados?”
O
olho sadio verá a luz. O coração sadio perceberá a verdade.
7.
Impondo condições a Deus. Tomé errou grandemente em querer
estipular condições cm que Cristo leria de vir a ele. “Sc eu
não... de maneira nenhuma crerei”. Definiu o caminho pelo qual
Jesus teria de vir a ele, e não quis perceber a presença do Senhor,
a não ser que fosse por aquele caminho. É certo que Cristo se
adaptou às fraquezas do melancólico discípulo, mas nem por isso
devemos repetir tal erro. Não podemos ditar ao Senhor os métodos
que deverá empregar para tratar conosco. O papel da criatura é
confiar no Criador, e não procurar limitar o Onipotente.
8.
A vista nem sempre é a visão. Leia o versículo 29. Esta época
materialista exige fatos concretos, mas, mesmo na vida cotidiana, há
diferença entre ver e perceber. Muitas pessoas passam nas galerias
de arte sem perceber nada de especial nas obras-primas, não
reconhecendo nelas qualquer significado ou valor.
Milhares
de pessoas viram Jesus enquanto estava aqui na terra, mas nem todas
perceberam ser Ele o Filho de Deus. Em contraste, milhares de pessoas
hoje, que nunca viram a Jesus fisicamente, reconhecem-no pelos olhos
da fé, de forma que Ele lhes é tão real como um amigo na terra.
“Não
posso crer”, disse um jovem descrente a D. L. Moody. “Fm quem
você não pode crer?” perguntou o evangelista. Respondeu hem! O
Cristianismo apresenta, cm primeiro lugar, uma Pessoa que merece
nossa confiança, c não tanto uma serie de proposições abstratas a
serem aceitas. Quando um amigo telefona dizendo que chegará a tal
hora, vamos para a estação nos encontrar com ele. Cristo nos avisou
que se encontrará conosco no local chamado Fe, e ali o acharemos.
Fonte:
Livro
226.5
- João
Pearlman,
Myer
PHAj
João, o Evangelho do Filho de Deus.../
Myer
Pearlman - l.ed. - Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembléias
de Deus, 1995. p. 236. cm. 14x2 1 ISBN 85-263-0025-3
I.
Comentário Bíblico. 2. João
CD
D - 226.5 - João
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