Jônatas, o filho mais
velho de Saul, entrou para a história à sombra do pai, mas pouca coisa herdou
de seu genitor. Ele demonstrou ser um jovem guerreiro, cheio de coragem e
determinação. E, aliada à sua coragem, logo afloraram sua humildade, sua fé e
obediência a Deus. Os fatos analisados neste capítulo indicam ser Jônatas
possuidor de um caráter bem diferente do de seu pai. Sua amizade por Davi não
foi fruto de um conhecimento familiar ou de amizade de longa data. A amizade
entre eles nasceu de forma inesperada, quando o príncipe assistiu de perto a
grande vitória do jovem pastor de ovelhas sobre o imbatível gigante Golias, o
campeão dos filisteus, que desafiava os exércitos israelitas e afrontava o nome
do Senhor dos Exércitos.
Foi então
que, após a grande vitória, Jônatas, que assistia ao duelo ao lado de Saul,
teve grande admiração por Davi e aliou-se a ele com uma amizade verdadeira e
sincera, tornando-se seu melhor amigo. Essa amizade, porém, tornou-se motivo de
ciúme por parte do pai, que passou a ver em Davi a maior ameaça a seu reino,
com apoio do próprio filho. A desconfiança transformou-se em ódio, e Saul fez
tudo para matar Davi.
Entretanto,
Jônatas, jovem temente a Deus, viu em Davi um homem talhado para ser o futuro
rei de Israel. Contrariando a visão carnal e diabólica do pai, Jônatas fez
“aliança do Senhor” com Davi, confiando que Deus tinha o controle da
história. Sua lealdade foi demonstrada em todas as ocasiões até o último dia em
que se encontraram pela última vez antes da morte de Jônatas. Ocasião esta em
que Davi fez um grave lamento, relembrando o amor fraternal e caloroso do seu
amigo.
I - CIRCUNSTÂNCIAS QUE UNIRAM JÔNATAS E
DAVI
1. Quem Era Jônatas
Era o
filho mais velho do rei Saul. Seu nome significa “dado por Deus” ou “presente
de Deus”. Era um jovem guerreiro que participava das batalhas contra os
inimigos de Israel, nas quais seu pai era envolvido. Certamente, assim como
acontecia com os primogênitos, Saul sonhava em preparar seu filho para ser seu
substituto no trono quando chegasse a ocasião oportuna. Ele tinha todas as
condições para ser um príncipe e substituto de seu pai: era valente e hábil no
combate. Sua bravura já fora provada quando, em Micmás, ele derrotou toda uma
guarnição dos filisteus, contando apenas com a ajuda de seu fiel escudeiro,
colocando sua fé em ação (1 Sm 14.1-14). Entretanto, por direção de Deus, os
rumos da história de Saul e de seu filho foram mudados completamente, e isso
ocorreu de forma surpreendente.
2. Uma Batalha que Mudou a História
Israel
estava no campo de batalha contra os filisteus, num monte, “no vale do
carvalho”, e os filisteus estavam do lado oposto do vale, também sobre um monte
(1 Sm 17.1-3). A batalha tomou um rumo inesperado. Do lado dos filisteus,
levantou-se Golias, um guerreiro de quase 3 metros de altura. Devidamente bem
equipado, o gigante filisteu era imbatível num combate individual. Armado com
lança, espada, escudo, couraça e capacete de bronze, além de auxiliado por um escudeiro,
ninguém estaria mais bem preparado para a guerra. E o filisteu desafiava os
exércitos de Israel, clamando, em tom arrogante, que fosse enviado um
homem para lutar contra ele. Caso fosse derrotado, Israel seria vencedor, e seu
povo subjugado. Se vencesse, Israel deveria entregar-se em servidão. Seu
desafio era intimidador: “Disse mais o filisteu: Hoje, desafio as companhias de
Israel, dizendo: Dai-me um homem, para que ambos pelejemos. Ouvindo, então,
Saul e todo o Israel essas palavras do filisteu, espantaram-se e temeram muito”
(1 Sm 17.10,11). Ninguém tinha coragem de enfrentar o gigante Golias. O clima
de medo prenunciava a provável derrota de Israel.
II - UMA AMIZADE APROVADA POR DEUS
1. Jônatas Torna-se Amigo de Davi
A atuação
corajosa de Davi na batalha contra Golias impressionou a todos os combatentes
de Israel. O povo de Israel jubilou diante da tremenda vitória. Saul ficou
estupefato e mandou Abner, o chefe do exército, chamar Davi, que levou a cabeça
do filisteu como troféu da batalha inusitada (1 Sm 17.52-58). Porém Jônatas,
filho de Saul, foi quem mais foi tocado em suas emoções e sentimentos fraternos
em relação ao jovem pastor, que derrotou o gigante com o uso de uma simples
funda e um tiro de pedra. De imediato, aquela admiração despertou em Jônatas um
sentimento de amizade e de amor fraternal que haveria de marcar para sempre a
história dos dois personagens que sequer se conheciam antes. Deus tem seus
caminhos e, quando Ele quer, cria ou muda circunstâncias conforme seus propósitos
soberanos.
2. Uma Amizade Fiel e Duradoura
Logo após
a batalha desigual contra Golias, todos se aproximavam e admiravam Davi. E foi
naquele momento que começou a amizade especial entre Jônatas e o jovem pastor
de ovelhas. A Bíblia registra com expressão tocante os sentimentos fraternos de
Jônatas por Davi. Diz o texto bíblico: “E Sucedeu que, acabando ele de falar
com Saul, a alma de Jônatas se ligou com a alma de Davi; e Jônatas o amou
como à sua própria alma” (1 Sm 18.1). Saul tomou Davi para viver no palácio e
não permitiu ele voltar para sua casa em Belém. Mais uma vez, a Bíblia indica a
profunda admiração de Jônatas, dizendo: “E Jônatas e Davi fizeram aliança;
porque Jônatas o amava como à sua própria alma. E Jônatas se despojou da capa
que trazia sobre si e a deu a Davi, como também as suas vestes, até a sua
espada, e o seu arco, e o seu cinto” (1 Sm 18.3,4). Essas expressões significam
que Jônatas não só admirava grandemente a coragem e audácia de Davi, como
também sentiu no seu íntimo que deveria nutrir por ele profunda amizade
fraternal.
3. Uma Aliança do Senhor
Grupos
homossexuais procuram distorcer o sentido desse texto em que a Bíblia diz que
Jônatas fez aliança com Davi, porque “o amava como à sua própria alma” e entregou
a Davi suas vestes e equipamentos de combate (1 Sm 18.3,4); e fazem-no de forma
desonesta e tendenciosa, afirmando que Jônatas sentiu atração sexual por Davi e
que os dois deram início a uma relação homoafetiva. Nada é mais incoerente com
a verdade bíblica. Jônatas era casado e pai de um filho, cujo nome era
Mefibosete (2 Sm 4.4). Em nenhum texto da Bíblia, é dito que Jônatas
desobedeceu a Deus e à sua Lei. Ele sabia que, se fosse homossexual, estaria
cometendo “abominação ao Senhor” e sofreria a pena de morte (Lv 18.22; 20.13).1
O fato de Jônatas despojar-se de suas vestes, de sua espada, de seu arco e de
seu cinto indica que ele consciente e amorosamente transferiu o direito ao
trono a seu amigo Davi.
Na
verdade, aquela amizade calorosa foi inspirada por Deus, pois Jônatas havería
de ser, tempos depois, o amigo que livraria Davi da sanha ciumenta e
sanguinária de Saul. Eles fizeram uma aliança aprovada por Deus, e não uma
parceria abominável aos olhos do Senhor: “E Jônatas e Davi fizeram aliança;
porque Jônatas o amava como à sua própria alma” (1 Sm 18.3). Mais tarde, eles
confirmaram-na como uma “aliança do Senhor”: “Usa, pois, de misericórdia com o
teu servo, porque fizeste a teu servo entrar contigo em aliança do Senhor
[...]” (1 Sm 20.8a). Esses grupos que vivem na prática de abominações valem-se
da declaração de Davi quando da morte de Jônatas para reforçar seus argumentos
maliciosos.
Ao saber
da morte do amigo, Davi fez um lamento de grande emoção e tristeza ao lado de
seu pai: “Angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; quão amabilíssimo me
eras! Mais maravilhoso me era o teu amor do que o amor das mulheres” (2 Sm
1.26). Tal afirmação revela que o amor fraternal entre eles tinha um sentido
espiritual e emocional tão profundo que superava até mesmo o amor das mulheres.
Jamais Jônatas e Davi, que fizeram “aliança do Senhor”, poderíam viver na
prática do que o Senhor chama de atos abomináveis (Lv 18.22; 20.13). Somente a
má-fé de quem usa a Palavra de Deus para justificar seus pecados pode afirmar
que os dois amigos eram homossexuais.
III - O CARÁTER DE JÔNATAS E SUAS LIÇÕES
Há um
ditado que diz: “Tal pai, tal filho”, sugerindo que os filhos tendem a
demonstrar o mesmo comportamento de seus pais. Mas tal entendimento não pode
ser generalizado, e o exemplo de Jônatas é prova disso. Seu caráter era
praticamente oposto ao de seu pai. Vejamos alguns aspectos do caráter de
Jônatas.
1. Um Homem de Coragem
Saul era
um homem inseguro e medroso. Jônatas não herdou e muito menos desenvolveu esse
traço da personalidade do pai, pois ele era corajoso. Em Micmás, ele lutou
contra a guarnição dos filisteus com seu pajem de armas e derrotou-os, pois
confiara em Deus. Sua coragem, porém, não era apenas física e emocional. Ele
também tinha grandeza espiritual que lhe dava confiança diante das adversidades
(1 Sm 14.1-4). Jônatas revelou firmeza diante dos inimigos, pois poderia ter
recuado, mas lutou bravamente e venceu — uma grande lição para quem quer ser
vencedor: não se desanimar nem se amedrontar diante das adversidades. O crente fiel
deve ter em mente que é Deus quem dá a vitória. O indispensável é ter a
convicção de que se está no centro da vontade de Deus (Sl 144.10; 1 Co 15.57).
2. Um Homem Humilde
Sua
coragem moral fê-lo não ter medo de perder para Davi a posição de herdeiro do
trono. Jônatas soube reconhecer que seu amigo tinha a direção de Deus, bem como
as condições humanas para substituir Saul no cargo de monarca de Israel (1 Sm
16.1,12,13) — um exemplo para os dias de hoje. Há, em igrejas evangélicas,
muitos que brigam por cargos e posições, agindo, muitas vezes, com métodos
carnais, seguindo o exemplo dos ímpios. Trata-se de obreiros carnais dominados
por “torpe ganância” (1 Tm 3.3). Humildade é uma qualidade que só os que têm
grandeza de alma possuem, e Deus agrada-se dos humildes. Pedro diz:
“Humilhai-vos, pois, debaixo da potente mão de Deus, para que, a seu tempo, vos
exalte” (1 Pe 5.6).
3. Um Homem Leal
A amizade
de Jônatas para com Davi revelou-se mais firme e leal a cada dia. Quanto mais
Deus abençoava Davi dando-lhe sucessivas vitórias no reino de Saul, mais
Jônatas afeiçoava-se a ele como amigo e confidente. Os resultados dessa amizade
não tardaram a provocar ciúmes no coração de Saul. Jônatas, porém, jamais ficou
ao lado do pai quando o mesmo voltou-se contra o seu amigo fiel.
1) Defendeu
Davi perante Saul. Em todas as ocasiões depois que se tornou amigo de Davi,
Jônatas demonstrou sua lealdade. Ele era fiel, dedicado e sincero —
características próprias de quem é leal. Jônatas podería ter ficado ao lado do
seu pai, mas não cedeu aos caprichos de Saul quando este, injustamente, quis
eliminar a vida de Davi. Quando soube do plano de Saul para matar Davi, Jônatas
procurou o amigo e advertiu-lhe do perigo de morte (1 Sm 19.1-3). Depois, em particular,
ele conversou com seu pai e falou bem de Davi, lembrando que Davi colocou sua
vida em risco no combate contra Golias, tendo sido motivo de grande livramento
para Israel. A princípio, Saul concordou e prometeu não fazer mal a Davi. Mas,
depois, instigado por um “espírito mau da parte do Senhor”, ou seja, por
permissão de Deus, Saul quis matar Davi quando este tocava sua harpa. “Porém o
espírito mau, da parte do Senhor, se tornou sobre Saul, estando ele assentado
em sua casa e tendo na mão a sua lança, e tangendo Davi com a mão o instrumento
de música” (1 Sm 19.9). Quando um homem sai da vontade do Senhor e desvia-se de
seus caminhos, fica vulnerável a todo o tipo de ação do Diabo em sua vida.
Jesus disse que seu último estado é pior do que o primeiro: “Quando o espírito
imundo tem saído do homem, anda por lugares secos, buscando repouso; e, não o
achando, diz: Tornarei para minha casa, de onde saí. E, chegando, acha-a
varrida e adornada. Então, vai e leva consigo outros sete espíritos piores do
que ele; e, entrando, habitam ali; e o último estado desse homem é pior do que
o primeiro” (Lc 11.24-26).
2) Fuga
e aliança diante de Deus. Diante de tão grande ameaça, Davi resolveu escapar,
fugindo de Saul, sendo ajudado por Mical, filha de Saul. E acabou indo para
Naiote, em Ramá, onde se encontrou com o profeta Samuel, deixando-o ciente dos
graves acontecimentos que o envolviam, por causa do ciúme e da maldade de Saul.
Sabendo onde encontrar Davi, Saul continuou sua perseguição (1 Sm 19.11-24). Davi
foi ao encontro de Jônatas, e ambos analisaram a situação delicada em que ele
estava. Ali, fizeram um pacto para o futuro, acordando que Davi faria
beneficência à casa de Jônatas, sob juramento eterno (1 Sm 20.11-17). Depois,
Jônatas combinou com Davi sobre como havería de alertá-lo em relação às reações
de Saul quando este descobrisse que Davi havia fugido. Davi ficou no campo, e
Jônatas voltou ao palácio.
3) Jônatas
defende Davi e é ameaçado por Saul. Quando Saul notou a ausência de Davi,
inquiriu de Jônatas o que ele já sabia. Jônatas disse que Davi pedira para ir à
sua terra para uma reunião da família. Saul ficou encolerizado e demonstrou sua
ira e insegurança quanto ao futuro do seu reino, tendo Davi como uma séria
ameaça. “Então, se acendeu a ira de Saul contra Jônatas, e disse-lhe: Filho da
perversa em rebeldia; não sei eu que tens elegido o filho de Jessé, para
vergonha tua e para vergonha da nudez de tua mãe? Porque todos os dias que o
filho de Jessé viver sobre a terra nem tu serás firme, nem o teu reino; pelo
que envia e traze-mo nesta hora, porque é digno de morte” (1 Sm 20.30,31).
Naquela
ocasião, Jônatas mais uma vez provou sua amizade e lealdade a Davi,
defendendo-o ante a cólera do pai: “Então, respondeu Jônatas a Saul, seu pai, e
lhe disse: Por que há de ele morrer? Que tem feito? Então, Saul atirou-lhe com
a lança, para o ferir; assim, entendeu Jônatas que já seu pai tinha determinado
matar a Davi” (1 Sm 20.32,33). Um homem que é dominado pela sede de poder e
pelo medo de perder sua posição é um fraco, um tolo que destrói a si próprio e
prejudica os que estão a seu redor, a seus familiares, aos amigos e a todos à
sua volta. Diz o patriarca Jó: “Porque a ira destrói o louco; e o zelo (ciúme)
mata o tolo” (Jó 5.2 - parêntese acrescentado).
4) Último
encontro entre Jônatas e Davi. Diante de tal reação descontrolada e violenta,
Jônatas retirou-se e foi avisar a Davi que Saul queria mesmo matá-lo. Quando se
encontraram, os dois amigos demonstraram seu amor fraternal profundo. “[...] e
beijaram-se um ao outro e choraram juntos, até que Davi chorou muito mais. E
disse Jônatas a Davi: Vai-te em paz, porque nós temos jurado ambos em nome do
Senhor, dizendo: O Senhor seja perpetuamente entre mim e ti e entre minha
semente e a tua semente. Então, se levantou Davi e se foi; e Jônatas entrou na
cidade” (1 Sm 20.41-43). Dali em diante, os dois amigos nunca mais se
encontraram. Saul continuou perseguindo Davi até ser morto na batalha contra os
filisteus na montanha de Gilboa.
Neste mesmo lugar, também foi morto Jônatas ao lado de seu pai.
Ao saber da morte trágica de Jônatas, Davi expressou-se em angustiado lamento:
“Como caíram os valentes no meio da peleja! Jônatas nos teus altos foi ferido!
Angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; quão amabilíssimo me eras! Mais
maravilhoso me era o teu-amor do que o amor das mulheres. Como caíram os
valentes, e pereceram as armas de guerra!” (2 Sm 1.25-27).
CONCLUSÃO
Deus usa
homens das mais diferentes formas e em meio a circunstâncias que escapam à
lógica humana e racional. Jônatas tinha tudo para ser o sucessor do pai segundo
as regras sucessórias estabelecidas na Lei e nos costumes da época. Deus, no
entanto, não está sujeito às leis nem aos costumes dos povos. Ele estabelece
sua vontade diretiva de forma inexorável, contrariando todas as expectativas e
previsões históricas ou políticas. Assim, em meio a um grave desafio contra o
povo de Israel, levantou o jovem Davi para derrotar o gigante filisteu.
Assistindo à extraordinária vitória, Jônatas sentiu profunda admiração pelo
jovem pastor de Belém e compreendeu que ele seria o escolhido por Deus. Em
lugar de inveja ou ciúme, Jônatas tornou-se o maior e mais leal amigo de Davi.
Fonte :
Livro o Caráter do
Cristão
Moldado pela Palavra de
Deus e provado como ouro
Elinaldo Renovato de Lima
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